Quando o árbitro deu o apito inicial para o SL Benfica Vs. Shakhtar Donetsk, os encarnados estavam a minutos de ficar sozinhos, de ombros pesados com a responsabilidade de serem os últimos a ter a possibilidade de manter as cores de Portugal no sorteio para a próxima fase da Liga Europa, que acontece já amanhã
As águias precisavam de dar a volta à eliminatória, depois da derrota por 2-1 na Ucrânia, e tinham um argumento e meio a seu favor: primeiro, o Benfica nunca perdeu em casa desde que a Taça UEFA mudou de nome para Liga Europa (a última derrota na Luz foi diante do Metalist, por 0-1, curiosamente também uma equipa ucraniana) e metade das vezes em que, em competições da UEFA, perderam por 2-1 na primeira-mão, conseguiram dar a volta à eliminatória.
Bruno Lage recusava, em conferência de imprensa, escolher entre o campeonato — no qual, nos últimos jogos, perdeu seis dos sete pontos de vantagem para o FC Porto — e a Liga Europa. Para o treinador português, o mais importante é o jogo seguinte e para o ‘jogo seguinte’ houve surpresas: Dyego Sousa estreou-se a titular. De resto o meio-campo voltou à variável Weigl/Taarabt, com o alemão a jogar mais junto dos centrais para projetar os laterais e envolvê-los mais no ataque.
Os encarnados entraram bem no jogo, a assumir a batuta da partida e fizeram-no em crescendo. Logo aos oito minutos, na sequência de um canto Taarabt apontou à baliza, mas o remate foi intercetado por Ismaily, ex-Sporting de Braga. Um minuto depois, um cruzamento forte de Pizzi esteve a centímetros de ser desviado por Rúben Dias para dentro da baliza, sendo que, logo a seguir, o médio transmontano, numa das vezes em que trocou de ala com Rafa, fez a diagonal para a área e com um remate colocado bateu Pyatov.
O cenário era bonito no estádio da Luz: casa bem composta, cânticos lá bem alto e a equipa da casa na frente da eliminatória. Mas três minutos depois, ainda estavam os adeptos a arrefecer dos festejos, o Shakhtar mostrava que esta ia ser uma eliminatória muito mais interessante do que se poderia imaginar. Marcos Antônio para Dodô, no lado direito da área, cruzou para a pequena área, onde apareceu Ferro, Junior Moraes e Rúben Dias, todos a deslizar pela relva à procura da bola. Como num jogo de flippers, entre os centrais do Benfica, a bola acabou por entrar. A UEFA atribuiu-o ao central internacional português.
O primeiro golo dos ucranianos no jogo, tão perto do golo inaugural dos encarnados, expôs as fragilidades da equipa de Bruno Lage. O facto de Rafa não defender e da criatividade estar depositada inteiramente em Taarabt dificultava as decisões no ataque das águias e a capacidade de causar mais estragos entrelinhas. O melhor exemplo desta primeira exposição aconteceu aos 20 minutos, quando a bola pingou na área encarnada e Grimaldo e Ferro ficaram à espera que o outro fizesse o corte, ao mesmo tempo que ninguém sabia de Rafa. No meio disto tudo, Ismaily apareceu na cara de Vlachodimos. Sorte para a equipa portuguesa que ainda viu o guardião a desviar a bola contra o poste.
O Benfica mostrava os seus problemas e o Shakhtar o seu forte, com os laterais projetados e um jogo de transição forte para apanhar a linha defensiva dos encarnados, mais subida, em contrapé. Apesar disso, seriam os encarnados a chegar ao golo, Rúben Dias a marcar, desta vez, na baliza certa, com uma grande cabeçada em resposta a um canto de Pizzi.
Ao intervalo a eliminatória estava empatada, mas ao abrir da segunda parte o Benfica mostrava-se decidido em contrariar o fado negro português nas competições europeias neste amargo dia 27 de fevereiro de 2020: 47 minutos, passe péssimo de Matvyenko para o guarda-redes Pyatov, Dyego Sousa pressiona o guardião da seleção ucraniana, ganha a bola, passa atrasado para Rafa que, em jeito, meteu o Benfica nos oitavos-de-final da Liga Europa… durante alguns minutos.
Aquela que foi a melhor hora do Benfica depois de vários jogos apagados em que se somaram três derrotas (FC Porto, Sporting de Braga e Shakhtar), um empate (Famalicão) e uma vitória (Gil Vicente), ia-se diluindo nos contra-ataques dos pupilos de Luís Castro que aos 49 minutos, de canto fizeram o 3-2, por Stepanenko, e aos 71 o 3-3 com Alan Patrick a responder a um cruzamento atrasado dentro de área de Ismaily e a atirar para o fundo da baliza.
E esta é a versão curta de como o Shakhtar chegou ao empate e que não inclui o remate ao lado de Marcos Antônio (54’) e o remate de Taison e recarga de Ismaily à barra (66’). Já o Benfica teve por Seferovic e Vinicius, que juntamente com Jota, entraram para os lugares de Dyego Sousa, Chiquinho e Pizzi, respetivamente, dois cabeceamentos mais ou menos perigosos.
No início deste texto dissemos que 50% das vezes que o Benfica, na Europa, perdeu 2-1 na primeira-mão, passou. Não dissemos foi que metade das vezes que o Shakhtar venceu 2-1 na primeira-mão, também passou. As probabilidades estavam igualmente partidas e cabia a cada uma das equipas aumentá-las, mas os ucranianos mostraram mais vontade de o fazer e capacidade de responder às adversidades, o Benfica não, faltou-lhe capacidade de resposta, ao adversário e ao seu mau momento.
O fim do jogo e consequente eliminação dos encarnados foi como a saída de Portugal das competições europeias à medida que cada jogo decorria: inevitável. E para isso basta dizer que este é o mês mais negro do Benfica desde dezembro de 2017, quando, na altura, o clube era orientado por Rui Vitória.
É com este empate que os encarnados se despedem pela primeira vez da Liga Europa nesta fase da competição. O campeão da liga portuguesa mostra-se incapaz de vencer o campeão ucraniano no mesmo dia em que Sporting CP e FC Porto também abandonam a competição e um dia depois de também o Sporting de Braga cair aos pés do Rangers. Numa data triste para o futebol nacional, o Benfica pode apenas dizer que lutou, mas que continuou a cair no fado do futebol português, um futebol que há vários anos que se acha muito melhor do que realmente é e que neste momento, como a melhor liga fora do top 5, precisa de se repensar num dia em que ninguém é melhor do que ninguém
Porta fechada. Europa, até para o ano.
Bitaites e postas de pescada
O que é que é isso, ó meu?
O terrível passe de Matvyenko para o guarda-redes Pyatov, o erro que esteve na origem do 3-1 para o Benfica, foi tão terrível que tive de ir ver a compilação de cruzamentos do Bebé no Manchester United para ganhar algum fôlego de vida.
Ismaily, a vantagem de ter duas pernas
Em Portugal jogou no Estoril, Olhanense e Sporting de Braga, hoje é um dos principais rostos do Shakhtar Donetsk no estilo de jogo de transição rápida de Luís Castro. Sabe conquistar espaços e lê bem o jogo. Não é por acaso que assistiu para um golo e atirou uma bola à barra e outra ao poste. Ele é a identidade do clube e um retrato dele em campo.
Fica na retina o cheiro a bom futebol
Adel Taarabt tornou-se num jogador tremendo. A frase que nunca se pensou que fosse dita depois de 2010, da sua grande temporada no Queen Park Rangers, está na mente de todos os benfiquistas que vêm o marroquino no meio-campo a contornar os adversários, a parar, a pensar e a executar passes com o mínimo de criatividade ora nas entrelinhas, ora em bolas longas a virar o jogo. É pena que seja o único.
Nem com dois pulmões vai chegar à bola
Rafa teve uma prestação defensiva terrível, deixando Grimaldo sozinho no lado esquerdo, o que causou vários problemas ao Benfica com os ucranianos a insistirem naquele lado para atacar. É difícil de assistir a um jogo destes quando na minha página de autor tenho um texto de análise com o título “Como jogas, Rafael Alexandre”.
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