O capitalismo tem destas coisas. Afunda sem dó nem piedade com a mesma facilidade com que eleva ao Olimpo. A empresa de rent-a-car Hertz é um bom exemplo disso. A 22 de maio, declarou falência e quatro dias depois as ações estavam em mínimos históricos de 40 cêntimos (de dólar). A 8 de junho o valor das ações tinha disparado 1400% - estavam então a 6 dólares – e assim continuou.

E de onde vêm tantos investidores interessados numa empresa que declarou falência e que tem 19 mil milhões de dólares de dívida sem ativos suficientes para a liquidar?
De uma plataforma chamada Robinhood (sim, é ironia) que levou 96 mil traders a comprar massivamente ações durante uma semana.

O que é a Robinhood? Basicamente é uma app para investir em bolsa para investidores não institucionais, muitos deles amadores ou curiosos que procuram ganhar dinheiro rápido com uma aposta certeira. Nos últimos tempos, empresas em processo de falência têm soado a estes investidores como uma boa oportunidade – a Hertz nem é a primeira, mas é a que teve números mais sonantes.

Os investidores do clube dos “grandes” dizem que comprar este tipo de ações é como “apanhar uma faca a cair”, mas o que é que isso importa, se com um pouco de sorte, se pode ganhar bom dinheiro entretanto. E também se pode perder, claro. Não é muito diferente de ir a Las Vegas e fazer justiça ao cognome tantas vezes dado de economia de casino.

O fenómeno é conhecido. Quanto mais pessoas compram, mais o preço sobe e assim continua até cair quando a maior parte das pessoas começa a vender. O racional económico está sobretudo em ganhar dinheiro no caminho – não propriamente no desfecho.

A Hertz anunciou entretanto a suspensão do plano para colocar à venda mais 500 milhões de ações, após a entidade reguladora dos mercados nos EUA, a Securities and Exchange Commission, ter expressado reservas e pedido revisão dos termos da oferta de venda.

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Três perguntas sobre como "isto" funciona a Bruno Janeiro, fundador da Air Trading  

Apps como a Robinhood aumentam os riscos de investir em bolsa? 
A Robinhood oferece aos seus utilizadores a possibilidade de investir em ações sem pagar comissões. O facto de não cobrar comissões leva muitos investidores de retalho sem experiência a especular em ações que cotam em valores perto de zero euros, onde as oscilações de pequenos cêntimos podem representar valorizações (ou desvalorizações) em termos percentuais bastante acentuadas.
Normalmente, as corretoras cobram uma comissão mínima independentemente do valor investido, ou seja, uma pessoa que pretenda especular numa empresa falida cujas ações estejam a ser negociadas abaixo de um dólar, terá de investir um valor significativo para que o peso da comissão seja baixa. Por exemplo, se a comissão for de 0,10% sobre o valor nominal com uma comissão mínima de 10 dólares, significa que num investimento de 10.000 dólares a comissão a pagar será de 10 dólares (=10.000 dólares X 0,10%), mas caso o investidor invista apenas 50 dólares, vai acabar por pagar uma comissão de 10 dólares (dado que se trata da comissão mínima). Neste último caso, a ação investida teria de valorizar 20% só para pagar a comissão.

Em Portugal qual é a adesão a este tipo de aplicações?
Não tenho dados suficientes para responder a esta questão, mas diria que ainda é muito reduzida. Contudo, a tendência é ao longo do tempo haver um aumento da procura por parte de investidores sem experiência e sem dinheiro, devido aos requisitos de abertura de conta com montantes pequenos e ao facto de não cobrar comissões.

Que conselho deixaria a quem usa este tipo de aplicações?
O principal conselho que deixaria às pessoas que usam este tipo de aplicações é que ninguém "dá" nada a ninguém de borla. O facto das corretoras cobrarem comissões deve-se aos custos de bolsa que as mesmas têm e à margem de negócio. Se a Robinhood não cobrar comissões, então como ganha dinheiro? Segundo dados divulgados pela empresa, as receitas advêm de pagamentos pelo fluxo de ordens de mercado transmitidas, uma prática comum (embora controversa) através da qual um corretor recebe remuneração e outros benefícios por direcionar ordens de mercado a outros brokers para a execução dessas ordens. A Robinhood refere-se a essa receita como "descontos de market makers (formadores de mercado) e bolsas de negociação". Embora os pagamentos sejam insignificantes para pequenas operações de retalho, uma empresa que direciona biliões de dólares em negociações para formadores de mercado pode ganhar quantias substanciais. Analistas independentes indicam que a Robinhood gerou 69 milhões de dólares em receitas em 2018, estando este número a crescer exponencialmente com o aumento de utilizadores.

Outras notícias do "Admirável Mundo Novo"

  • Mais pão, menos sexo: Dois meses de confinamento e um mês de desconfinamento lento depois, a pergunta é: será que daqui a 9, 8 ou 7 meses vamos ter um baby boom? Os primeiros dados dizem-nos que não – pelo menos no que respeita à realidade americana. Segundo um relatório da Brookings Institution, a preocupação com o futuro – nomeadamente com a recessão – falou mais alto que o maior tempo a dois e no próximo ano deverão nascer menos 500 mil bebés nos Estados Unidos.A verdade é que mesmo sem recessão a tendência para menos sexo já era detetada em vários estudos, nomeadamente entre os homens mais jovens. E, adivinhem, parece que também aqui a tecnologia veio alterar a forma como nos relacionamos uns com os outros. Um dos estudos mais vastos analisou durante 18 anos a frequência de atividade sexual e o número de parceiros para homens e mulheres entre os 18 e os 44 anos. Cerca de um terço dos homens entre os 18 e os 24 anos responderam que não tinham tido qualquer relação sexual no ano anterior: isto em 2016-2018, quando em 2000-2002 apenas 18,3% davam esta resposta. Nas mulheres regista-se a mesma tendência, mas de forma menos acentuada.
  • Deitar conversa fora afinal é bom para o ambiente de trabalho: Em inglês diz-se “small talk”. É aquela conversa junta à máquina do café ou de uma secretária para outra que pode tanto ser sobre o restaurante onde se foi no fim de semana como sobre qualquer trica que passou nas notícias. Garantidamente não é sobre trabalho – e também não confundir com a “rádio alcatifa” que é outra instituição corporativa. O certo é que estas conversas mundanas são muitas vezes vistas como algo que diminui a produtividade, mas um estudo publicado por Jessica Methot da Rutgers University conclui que talvez não seja bem assim. “O que descobrimos é que os trabalhadores que têm este tipo de conversas acabam por ter emoções mais positivas. Faz com que sintam mais reconhecidos e dá-lhes uma sensação de ligação aos outros. O que faz com que mais facilmente ajudem os outros”, disse a autora ao New York Times.
  • Que ações comprar na aviação? Vai parecer estranho, mas apesar dos milhões que irão ser despejados nas grandes companhias, a Morgan Stanley recomenda mesmo as low cost.
  • Quando é que estará confortável para voltar a fazer o que fazia antes?  O The New York Times perguntou e 511 epidemiologistas responderam assim. A reter: só 3% responderam que iriam a um evento desportivo ou a um concerto este verão.

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