Agora que se sabe que a Comissão Europeia vai dar três semanas a Portugal para apresentar um plano B de correção do défice orçamental, o global e, mais importante, o estrutural, quem é que pode dizer-se surpreendido? Seguramente, nem Passos Coelho, nem António Costa. Ambos fizeram, à sua maneira, o que era preciso para Portugal ser a principal preocupação europeia – a Grécia já está noutro campeonato há muito. É mais fácil apontar o dedo ao ministro das Finanças alemão, o novo bode expiatório que serve para quase tudo. E o Brexit, claro.
Maria Luís Albuquerque – e Passos Coelho e Paulo Portas – falhou objetivo de défice público de 2015 por puras razões eleitorais. O que não fizeram em 2015 estragou o que fizeram nos três anos e meio anteriores. É bom recordar, parece que MLA já se esqueceu, que anunciou uma meta de défice de 2,5% e acabou em 3,1%. Pior ainda, o défice estrutural agravou-se. Deveria ter pudor em falar, sobretudo quando afirmou que se estivesse nas Finanças não haveria sanções. O Governo de coligação seguiu a troika até 2014, recuperou a credibilidade do país, e depois seguiu as eleições. Depois, Mário Centeno e António Costa desenharam uma política exatamente ao contrário do que o país precisa. Puseram os interesses do PS em primeiro lugar, e apostaram numa estratégia económica e orçamental para ganharem eleições antecipadas. Resultados são os que se sabem, o investimento parou, a criação de emprego também, e o crescimento económico será claramente inferior ao previsto. O FMI já aponta para 1%, claramente abaixo dos 1,8% do Orçamento. Não, o Brexit não explica quase nada.
Já se esqueceram das negociações do Governo com Bruxelas por causa do orçamento deste ano, das sucessivas revisões que deram, depois, origem aos aumentos de impostos indiretos, por exemplo? É neste quadro que a Comissão Europeia se prepara para anunciar sanções a Portugal ou, melhor, um prazo de três semanas para o Governo mudar de vida. Em Portugal, os políticos gritam, Marcelo Rebelo de Sousa diz que é esta Europa que nos trouxe aqui. Errado. Estamos, outra vez, à beira de um resgate, por motivos económicos e financeiros. E os juros da República (ainda) não dispararam por causa do programa de compras do BCE, o quantitative easing, que também tem limites e estão, eles próprios a aproximar-se. Não por acaso, o presidente do Mecanismo Europeu de Estabilidade, Klaus Regling, disse no final da semana passada que Portugal é a principal fonte de preocupação na Europa.
Na verdade, a Comissão está a dizer que não quer sancionar a derrapagem orçamental de 2015, provavelmente por simpatia política com o anterior governo, mas não vai dar qualquer folga em 2016.
Qual é o estado da nação? A economia portuguesa patina, o Governo afastou a iniciativa privada e, sobretudo, o investimento estrangeiro, a banca é um mundo de problemas ainda por resolver que o anterior Governo meteu debaixo do tapete. Estão mesmo surpreendidos com as anunciadas sanções? Melhor faria o Governo em apresentar um plano B com pés e cabeça, e reverter algumas das reversões decididas nos últimos seis meses.
É claro que Costa não tem alternativa realista senão a de ceder a Bruxelas, vamos ver a repetição da crise política de fevereiro. Veremos se será capaz de segurar o apoio do BE e do PCP ou se joga a carta das eleições antecipadas e tenta beneficiar das reversões salariais e de pensões dos últimos meses. A outra alternativa, claro, é continuar com a estratégia que seguiu até agora e levar-nos contra uma parede.
As escolhas
Entre a parede financeira e o céu futebolístico, que alimenta a alma de um país e faz esquecer a carteira, nem que seja por uma semana. Somos de extremos. Portugal é um país de treinadores de bancada, que sai de casa nos grandes jogos. Na quarta-feira, a seleção volta ao relvado para as meias-finais do Europeu. Portugal allez, também aqui em 24.sapo.pt.
Boa semana.
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