Tanto o clube de Lisboa, em maio de 2018, como o partido de Soares, em novembro de 2014, passaram por choques mediáticos que muitos vaticinaram serem irreversíveis para as ambições de ambas as instituições. Neste momento, acontece precisamente o contrário: é quase inevitável que o Sporting vença o campeonato e o facto de o Partido Socialista continuar a governar o país nos próximos anos parece também ser inelutável.
Estes dois caminhos para a redenção são, no entanto, muito diferentes. Se os sportinguistas enfrentaram o seu passado recente, refletindo sobre como é que se deixa que alguém sequestre o poder, os socialistas não o fizeram. Os sportinguistas optaram por um novo líder que até parecia insosso, os socialistas optaram por um novo líder que não se importa de ser sonso. António Costa tem uma frase a que recorre sempre que um jornalista lhe acena com novos dados sobre o Processo Marquês: "À política o que é da política, à justiça o que é da justiça". É uma carta — não uma get out of jail card [mas uma get away with not talking about your former friend that can go to jail card — que usa há mais de meia década. O que é impressionante é que este trunfo continua a funcionar passados estes anos, sem ninguém acusar Costa de estar a fazer renúncia.
É compreensível: em desculpa que ganha, não se mexe. É que saiu uma sondagem esta semana, com respostas recolhidas já depois de o juiz Ivo Rosa ter posto o país todo a dizer "mercadejar", em que o PS só cai um ponto e meio em relação ao anterior estudo e inclusivamente supera o resultado que teve nas legislativas de 2019. O partido de José Sócrates sai ileso e o ex-ministro de José Sócrates é o líder partidário mais popular do país, o único com saldo positivo de popularidade. Já sabíamos que António Costa era um sobrevivente político, mas estes dados comprovam que Costa não só sobrevive a terramotos políticos, como nem sequer os sente. Sócrates deve ser a pior pessoa do Mundo a fazer vudu, porque as maldições que lança ao PS parecem ter tornado António Costa verdadeiramente indestrutível.
Na semana da leitura do despacho de instrução, o vice-presidente da bancada parlamentar do PS Pedro Delgado Alves defendeu que o partido devia fazer uma autocrítica em relação ao caso de José Sócrates. Aparentemente, foi uma ideia rapidamente rejeitada. Pois claro. "Onde é que tens a cabeça, Pedro? Se isto está a correr tão bem, para quê falar no assunto? Se estamos relativamente confortáveis com o elefante nesta assoalhada, para quê ter o trabalho de o expulsar?". Dizia-se que o PS não sobreviveria a um caso de um ex-primeiro ministro acusado de corrupção. Neste momento, tenho a convicção de que ainda teria a capacidade de lidar com mais dois ou três.
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