É a semana em que tudo isto aconteceu, mas a razão pela qual trago Dorsey até estas linhas, é outra. O Twitter é, desde a sua fundação, uma marca querida de influenciadores. Numa visão mais cáustica, é também uma marca querida da carneirada que não quer fazer parte da carneirada, usando uma expressão da eterna Mafalda criada pelo Quino. O Twitter cresceu significativamente desde o seu lançamento e entrou em Bolsa há dois anos em clima de grande excitação. Clima esse que durou pouco, porque nem os utilizadores cresceram ao ritmo que os investidores esperavam, nem o Twitter mostrou ter pernas para a sua concorrência mais tradicional, aka Facebook, ou mais modernaça, aka Snapchat. Os investidores, como se sabe, são uma mulher caprichosa e volátil e deram sinais de desinteressse, o que, no mercado tecnológico, onde sempre há um new kid on the block, pode ser fatal.
O regresso do fundador ao Twitter foi bem recebido. A Bolsa, as Mecas da tecnologia e os seus arautos gostam de comebacks. Ainda por cima, Dorsey é jovem, tem estilo e há qualquer coisa nele que leva as pessoas a pensar em Steve Jobs (provavelmente a coisa mais parecida é mesmo os dois terem sido despedidos das empresas que fundaram). Se a vida empresarial correr tão bem a Dorsey como a Jobs, é altura de colocar trocos a valer no Twitter.
Dorsey regressou com um new look – a indústria tecnológica partilha também alguns tiques da indústria de celebridades. O culto de imagem é um deles e, acreditem, aquela coisa da imagem aparentemente descuidada dá bastante trabalho. O de novo CEO do Twitter apareceu sem barba, cabelo aparado, um homem crescido nos seus 38 anos anos de maturidade. A imprensa reparou – e a twittosfera também, claro.
Dorsey regressou ao mesmo tempo que o Twitter lança um novo produto, “Moments”, uma proposta de agregação das histórias que marcam o dia concebida para conquistar novos utilizadores, nomeadamente aqueles que acham o Twitter pouco ou nada útil ou que simplesmente não percebem como funciona (alerta à navegação: se o “Moments” funcionar e se com isso o Twitter se tornar mais mainstream, vai perder alguns fanboys e vai possivelmente ter mais publicidade, de que precisa para poder continuar a pagar contas e a crescer; nada disto significa que ficará um pior serviço, mas, mais uma vez, como na música ou no cinema, se muitos gostarem pode significar que uns poucos terão de se desinteressar e ir à procura de qualquer outra coisa que os faça sentir especiais e únicos).
Aconteceram todas estas coisas em poucos dias e ainda mais uma. Jack Dorsey não perdeu muito tempo a reorganizar a empresa que ajudou a fundar. Na terça-feira, dia 13 de outubro, enviou um email a todos os trabalhadores da empresa informando que iriam ser despedidas cerca de 300 pessoas. 336, para ser mais exacta, 8% de toda a equipa. “Tomámos uma decisão extremanente difícil: planeamos abrir mão de 336 pessoas que estão na empresa. Fazemo-lo com o maior respeito por cada uma delas. O Twitter fará tudo ao seu alcance para apoiar cada uma destas pessoas, propondo-lhes pacotes de saída generosos e ajudando-as a encontrar um novo emprego”.
Este é um email que merece vários comentários. Pela forma e pelo conteúdo. Pela forma, o site Quartz fez provavelmente o comentário mais assertivo que podia ser feito. Dorsey começa a sua comunicação por dizer: “emails como este estão geralmente encriptados no discurso corporativo e por isso vou dizer-vos directamente o que há para dizer”. É um bom princípio, não apenas para o patrão do Twitter, mas para todos os que gerem pessoas. Imaginam o quão fartas estão da conversa corportativa e das palavras que não querem dizer coisa nenhuma ou que apenas dissimulam o que querem realmente dizer?! Cortem com isso.
Mas a verdade é que não é fácil dizer, assim do pé para a mão, que se vão mandar embora 336 pessoas, algumas delas provavelmente em lugares chave da engenharia e da gestão. Dorsey tentou, mas não se pode dizer que tenha conseguido em toda a linha. O Quartz deu-lhe uma ajuda e editou o email para o tornar ainda mais directo e claro. “Tomámos uma decisão extremanente difícil: vamos despedir 336 pessoas em toda a empresa (…) Essas pessoas não têm culpa de nada. Nós é que as contratámos e não devíamos ter feito. O Twitter vai dar-lhes indemnizações decentes e ajudá-las a encontrar um novo emprego”.
A outra parte tem a ver com o conteúdo da decisão. Não é fácil despedir pessoas. É ainda menos fácil quando algumas dessas pessoas foram contratadas por quem as despede e algumas, naturalmente, se tornaram mais que colegas. Mas é muito mais difícil – e errado – deixar que um conjunto maior de pessoas perca o rumo e, no limite, possa perder o emprego porque quem decide não foi capaz de tomar decisões. Não há formas fáceis de fazer mudanças, sobretudo quando visam corrigir uma rota de perdas. Geralmente implicam cortes e menores níveis de conforto, pessoal e no negócio. O facto de quem decide assumir os erros passados não torna o momento menos penoso. O Twitter falhou em vários momentos – na gestão dos produtos, nas pessoas que escolheu, na estratégia que adoptou. Reconhecer isso não torna a vida mais fácil a quem se vai embora (e nem a quem fica). Mas tornar a vida corporativa mais honesta – mais humana – pode ser um passo pequeno para um homem ou uma empresa, mas é sem dúvida um passo necessário para todos os humanos que trabalham, têm colegas, chefes, patrões, clientes e cada vez mais procuram na sua profissão, também, um sentido para a vida.
Mas nada como fechar com humor. Através de um tweet, claro:
in a week @jack takes back his first company, restructures it and then files the S-1 on another today i walked my dog and made myself soup
— ಠ_ಠ (@MikeIsaac) October 14, 2015
Tenham um bom fim de semana.
Leituras sugeridas sobre coisas estranhas, ou nem por isso.
Em menos de 12 horas, uma iniciativa de crowdfunding conseguiu juntar 1000 dólares. Para quê? Para pagar a multa de 500 dólares de uma mulher aborígene acusada de ter roubado uma caixa de tampões.
Noutro ponto do planeta, bem longe da Austrália, os tampões também são um tema do momento. Na Suécia, transformaram-se em personagem de um programa de televisão para crianças. E cantam.
E porque o tema de hoje é o Twitter, deixo-vos com esta curiosidade do reino humano, animal, tecnológico e do marketing. Tudo numa só notícia: a do restaurante australiano que decidiu colocar uma galinha a gerir a sua conta de twitter.
Comentários