O rapper britânico Skepta tem um tema chamado “Shutdown” que começa com a expressão “Truss me daddy”. Infelizmente, a música é de 2016 e “Truss” é somente uma corruptela de “trust” (confiar) e não uma referência à atual primeira-ministra britânica, Liz Truss. Mas podia muito bem ser, já que a Conservadora — tal como acredito que façam as pessoas que dizem “Truss me daddy” — pediu a confiança dos ingleses, para imediatamente desiludi-los.

O novo ministro das finanças britânico (Chancellor of The Exchequer em inglês, porque eles têm a mania), Kwasi Kwarteng, apresentou um plano de alívio fiscal aos mais ricos que precipitou uma queda abrupta da libra, provocou pânico nos mercados e descredibilizou por completo o recém-empossado executivo Tory. Não é só o Skepta, é o Reino Unido que está em shutdown.

No meu tempo, a direita rasgava as vestes enquanto falava de responsabilidade orçamental, desprezando a esquerda despesista e financeiramente suicida. Agora, tudo mudou. É que o conservador Kwasi Kwarteng ignorou por completo os procedimentos e não fez passar o plano de choque fiscal (entretanto revertido) pelo órgão independente de responsabilidade orçamental. Mesmo à "esquerdalho" que tem aversão a tecnocratas! Mais, o FMI criticou severamente as medidas do governo britânico, afirmando que deviam ser “reavaliadas”. Eh, rebelde! Mas quê, temos aqui um Varoufakis de Canary Wharf? O que é que se segue: dizer num jantar-comício dos Tories que se devia ameaçar os credores com o incumprimento da dívida, como um jovem Pedro Nuno? Vamos ver. O que é certo é que agora será a vez dos trabalhistas, tal como fez o Partido Socialista por cá, se assumir como o partido das contas certas. Pouco a pouco, começa a ser difícil sustentar a ideia de que indivíduos de direita são melhores a matemática.

A justificação para a confusão gerada por este mini-orçamento chegou esta terça-feira, quando Kwasi Kwarteng pôs as culpas dos erros do plano na morte da rainha. Pronto. Pessoalmente, não sabia que as folhas de Excel podiam ficar ensopadas em lágrimas.

Mas eu percebo: por aqueles dias, o ministro das finanças andou muito ocupado a calcular que percentagem do orçamento ia para a ração dos corgis da rainha. Kwasi Kwarteng deve ter ficado toldado pela emoção das cerimónias fúnebres e pensado: "Epá, estes ricos têm imensa despesa em funerais. Vou baixar-lhes os impostos!". Atenção, é efetivamente uma boa desculpa. Se estivermos a falar de não entregar a tempo um trabalho de Ciências Naturais do sexto ano. Depois de se pôr a quinta maior economia do Mundo à beira do colapso, exige-se mais imaginação.

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