Por mais que confiemos nas tecnologias, não é preciso exagerar na preguiça, armar-se em norte-americano ou espanhol e recusar-se a aprender as palavrinhas mágicas da boa educação na língua local. Aquelas que os nossos pais tanto insistiram que aprendêssemos e que repetíssemos, em especial quando as tias velhas nos ofereciam chocolates em troca de um puxãozinho de bochechas. Mas isso é outra conversa. O que agora nos interessa é a possibilidade de sermos mordidos por uma cobra no meio de uma selva no Vietname sem falar uma palavra do dialeto local ou comermos gato por lebre num restaurante de rua chinês só porque não fazemos a mínima ideia do que consta no menu. Temas que se tornam realmente importantes quando estamos em viagem, como acontece com muitos do que estão ou vão de férias.

O universo atual de apps de tradução para viajantes parece tão vasto quanto a própria Torre de Babel e tal como o “confundir de línguas” que deu origem à história bíblica, que os santos nos ajudem a saber escolher aquela que mais jeito nos dará. Ou, em contrapartida, fazer uma pesquisa nos divinos motores de busca e rezar para sabermos separar o trigo do joio. Mergulhemos então nas mais recentes ofertas de destrava línguas tecnológicos, em particular nas guerras-de-scrabble entre os principais concorrentes.

Google aposta na tradução visual instantânea…

Se é certo que o Verão continua a ser a época por excelência para os turistas zarparem para novas paragens, também é cada vez mais usual viajar-se em qualquer que seja a altura do ano. Mas tanto a Google como, uns dias mais tarde, a Microsoft esperaram pelo pico do Verão para colocarem no mercado as suas mais recentes ofertas em tecnologias de tradução. A primeira expandiu o seu repertório de línguas na sua Translate app em finais de Julho e a segunda lançou uma novinha em folha já em Agosto.

Gratuita, apesar de se aconselhar uma utilização prévia para, numa altura de aflição, não trocarmos alhos por bugalhos e dizermos alguma asneira em búlgaro, a Google app Translate não é instantaneamente nossa amigaou friendly como se diz na gíria. Concebida tanto para iOS como para Android, a app da Google acabou de adicionar 20 novas línguas à sua coleção – até agora tinha apenas sete, com o Português incluído nesta primeira fornada – traduzindo agora para checo, dinamarquês, búlgaro, finlandês, turco, ucraniano, indonésio, entre várias outras, com o hindi e o tailandês a funcionarem apenas a partir do “par” inglês. A app Google Translate
oferece três formas de tradução de texto: através da escrita, da fala ou apontando a câmara do telefone para um sinal, um livro ou outro objeto que contenha texto, o qual é automaticamente traduzido na língua da sua escolha.

Em segundos, as palavras que para si eram chinês, são traduzidas para a língua que pretende, muito ao estilo da realidade virtual. Não esteja à espera, contudo, que esta funcionalidade seja útil com frases mais extensas ou complicadas. Mas, a dita app pode ser realmente vantajosa em várias ocasiões. Imagine que está a pedir indicações para visitar, uma das 60 ruas que compõem o famoso Grande Bazar em Istambul. Pode falar, escrever ou desenhar com os dedos os caracteres no ecrã do seu smartphone e seja o que for que pretende encontrar “salta-lhe”, ao jeito do velho pop-up, no turco pretendido.

Esta app permite também transliterações [imprescindíveis para alfabetos alternativos], muito úteis, por exemplo, para os que visitam aquele país que tem agora as ilhas à venda (apesar de os portugueses saberem de cor o que significa nai oxi, não chega) e tem ao seu dispor também um ícone que poderá pressionar para que as palavras sejam pronunciadas em voz alta.

Uma outra funcionalidade útil para ocasiões que se repetem - como por exemplo ‘onde posso encontrar o multibanco mais próximo” – pode igualmente ser guardada numa pasta de “favoritos” de fácil acesso a qualquer altura. Depois de iniciado o processo – de escrita ou verbalização na sua língua nativa, seguidamente vista e/ou ouvida na língua de “chegada” – a app apresenta outras opções vantajosas. Por exemplo, se gosta de meter conversa na rua com os locais, pode iniciar uma conversa já traduzida no ecrã do seu telefone com quem quer que seja. A partir daí e se quiser continuar a prosa, seja via escrita ou falada, a app “ouve” e reconhece qualquer que seja a língua em causa e vai traduzindo à medida que a cavaqueira continua.

Tal como acontece com várias das suas concorrentes e porque a Internet quando nasce ainda não chega a todos os locais, a ferramenta de tradução visual funciona em modo offline. Mais uma vez, aconselha-se um período de exploração e habituação à mesma antes de se aventurar por línguas jamais navegadas.

… e a Microsoft oferece o maior menu de línguas disponíveis com particular aposta nos smartwatches

Apesar de já se ter aventurado pelos tortuosos caminhos da tradução online, através do Bing e em conjunto com o programa Skype Translator (que em breve fará também a sua estreia enquanto app de tradução), pela primeira vez a Microsoft resolveu expandir as suas funcionalidades de tradução não só para o mundo dos dispositivos móveis compatíveis com iOS e Android, mas também para os
smartwatches.

Lançada a 7 de Agosto último, a Microsoft Translator corre em telemóveis e tablets, mas também no Applewatch e em outros “relógios inteligentes”, se bem que em férias mais inteligente seria não usar relógio. Apesar de não apresentar funcionalidades por demais inovadoras face à concorrência, a app da Microsoft permite escrever ou verbalizar a palavra ou frase que se quer traduzir, mostrando o texto traduzido no ecrã e repetindo-o em voz alta. É também possível copiar e colar texto de e para outras apps e passar à sua tradução. Para já, a Microsoft vai à frente no número de línguas que disponibiliza para texto e voz – 50 – e é com este número redondo que decidiu entrar em território até aqui dominado pela Google.

Sem ter a opção da câmara da sua concorrente acima mencionada, o Microsoft Translator oferece benefícios extra aos utilizadores do Apple Watch (será que Steve Jobs estará a sorrir do além?). Tal como qualquer 007 moderno que se preze, o utilizador pode falar diretamente para o seu relógio e obter a tradução instantânea em qualquer uma das 50 línguas disponíveis. A app consegue ainda pronunciar corretamente a frase por si “comunicada” através do mesmo e todas as traduções e definições são sincronizadas entre o relógio e o seu telefone.

Em termos de satisfação e por ser ainda muito recente, não foram ainda muitos os utilizadores que a avaliaram, mas em termos gerais alcança uma pontuação de 4.5 (em 5), exatamente a mesma que é dada por um número significativamente superior de utilizadores que o fizeram na Google Play store. O único senão (porque quanto mais se tem, mais se precisa) é que para algumas línguas, como o hebreu, o tailandês ou o vietnamita, a dita app da Microsoft não oferece a opção “falada”. Não sabemos como é que os pobres viajantes irão conseguir viver sem esta opção, mas a vida é assim. Dura, mesmo em férias.

Sem precisar de tradução, uma última e obrigatória sugestão

Chama-se Toilet Finder e, para o comum dos mortais, deverá ser a mais importante app de todos os tempos. Tal como o nome indica, esta app ajuda-o a encontrar as casas-de-banho públicas mais próximas seja lá onde estiver e a vontade apertar, oferecendo ainda informações adicionais como, por exemplo, se a mesma tem condições para trocar as fraldas do seu bebé ou acesso para pessoas com deficiência. Com mais de dois milhões de downloads efetuados, a aplicação “onde está a casa-de-banho mais próxima” é um sucesso. Criada pela BeTomorrow, sedeada em Bordéus, esta app conta com a maior base de dados das ditas do mundo inteiro e, desde que foi criada, nunca mais parou de responder às mais urgentes necessidades dos seus utilizadores.

Helena Oliveira é editora do Portal VER, tradutora e autora de “Palavras de Steve Jobs” e coordenadora de várias publicações na esfera económica. Gosta de fazer incursões noutros territórios editoriais e, desta curiosidade resultou já o conto infantil “O verdadeiro Pai Natal”. Gosta de ler, e de ler, e de ler, que são basicamente os seus hobbies favoritos. Antropóloga de formação, interessa-se pelo comportamento humano em geral, e pela sua interceção com as tecnologias em particular. O estranho e culturalmente fértil mundo das empresas é, igualmente, uma das suas áreas de preferência.