Como o próprio nome sugere, a ação de "1899" tem lugar perto do final do séc. XIX e centra-se na viagem de um barco a vapor que vai levar um grupo pan-europeu de emigrantes — um casal francês em lua de mel, um padre português (o ator José Pimentão), uma geisha e uma neurologista inglesa — do Velho Continente até Nova Iorque. Trata-se de um eclético conjunto de passageiros, com segredos e passados assombrosos. Mas há algo que têm em comum: realizar o "Sonho Americano".
No entanto, a meio da jornada transatlântica para algo melhor, dá-se uma situação que faz desvanecer este entusiasmo da coletividade: o capitão recebe o que parece ser uma mensagem de SOS, proveniente de um navio chamado "Prometheus". A estranheza? O navio está desaparecido há meses e acredita-se que esteja no fundo do oceano. O problema? O dito capitão decide ir ao local à procura de sobreviventes numa missão de resgate em direção a uma espécie de triângulo das Bermudas.
Estrutura: A primeira temporada terá apenas oito episódios (mas cada um tem quase uma hora ou mais).
Curiosidade: Com um orçamento de pelo menos 60 milhões de euros, é a série alemã mais cara de sempre.
Influência: A crise migratória europeia e o Brexit inspiraram o criador a construir alguns pedaços da história.
Mas porque decidimos nós falar sobre esta série? Muito por culpa do legado de "Dark", série alemã criada pela dupla Baran Bo Odar e Jantje Friese, que atingiu o estatuto "de culto" nos últimos anos.
Nascida numa altura em que a Netflix procurava alargar o seu catálogo de originais e de expandir os seus tentáculos à escala global, a gigante do streaming descobriu na Alemanha, com a ajuda da produtora Wiedemann & Berg (responsável pelo excelente "As Vidas dos Outros", vencedor de um Óscar de Melhor Filme Estrangeiro), um conteúdo cerebral que vive de mistério, puzzles, física quântica e muito coçar de cabeça à boleia de um sentimento "o que é que se passou aqui".
Passada numa pequena vila alemã, "Dark" segue de perto o drama de quatro famílias que têm de lidar com o desaparecimento de duas crianças que desvaneceram sem deixar rasto. Ninguém sabe explicar o porquê, nem muito menos o como. Esta é premissa, sem revelar grandes spoilers. Mas a quem nunca viu, refira-se a existência de cruzamento de personagens, timelines, histórias e viagens no tempo.
O seu apelo passa pela sua génese puzzle/quebra-cabeças. As pistas, para o olhar mais atento, estão lá. O argumento não se embrulha, apesar de estar sempre a colocar questões novas sem ter dado respostas às anteriores. Nada é por acaso, nada está a mais. E, no fim, tudo faz sentido, ainda que seja complicado perceber e assimilar toda a informação — valha-nos os fóruns e vídeos de explicação do YouTube para esclarecermos o que ficou pendurado.
Contudo, não é uma série para todos. Afinal, não é qualquer um que tem paciência para voltas e reviravoltas ou para assumir o papel de detetive. Quem gosta de narrativas lineares dificilmente vai ver algum apelo aqui. No entanto, para quem gosta, dá-se precisamente o contrário: há o conforto de saber que "está tudo ligado", qual teia de pequenos detalhes, que fazem de "Dark" uma série especial e diferente. Porque há muitos exemplos ao longo das três temporadas. Difícil, como aos Pokémon's, é apanhá-los todos.
Depois, conseguiu algo que nem sempre acontece nestas andanças: teve um final satisfatório e respondeu a todas as questões (e foram muitas…) que se foram fazendo. Por muita interrogação que levantasse e que tivesse sugerido, satisfez e recompensou quem seguiu toda a caminhada.
Agora, "1899" vai tentar ir beber desse sucesso, aplicando uma fórmula semelhante, mas com uma ambição redobrada, inclusive no orçamento, que esticou ao ponto de ter um estúdio inovador e especial para que o CGI ficasse no ponto. Portanto, a pressão não nos ombros dos criadores não podia ser maior — vamos só ver se, chegando por força do legado de "Dark", as expectativas não vão afundar o barco.
Em resumo: Tal como aconteceu com "Dark", e pelo que se lê nas críticas que vão ficando disponíveis, "1899" tem potencial para se tornar numa obsessão e fenómeno de popularidade. As pistas em formas de símbolos, números e datas continuam presentes. Assim como o ator Andreas Pietschmann ("O Estranho") dá o embalo nostálgico para os fãs da glória que nos traz aqui hoje. Mas para saber se a segunda vai seguir as pisadas "de culto" da primeira, vamos ter de esperar e ver.
Quanto ao futuro, segundo uma entrevista dada pelos criadores à Deadline, a "sua visão" passa para que esta seja uma série "de várias temporadas". Mas já se sabe como funcionam estas coisas. Vai tudo depender dos números e do que a Netflix tem planeado.
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