A IMPERFEITA nasceu num tempo imperfeito pelas mãos de Adriana Scartaris e a história desta exposição não seria, provavelmente, a mesma noutro tempo e com outra protagonista. O tempo foi a pandemia global que eclodiu no ano de 2020 e a protagonista é uma empreendedora e artista brasileira que assistiu com estupefação e medo à realidade de um mundo dividido ao meio, entre quem podia e não podia se proteger, mas desligado como um todo, porque muitas pontes estavam interrompidas.
"Estava assustada como mulher e como empreendedora e sensibilizada como artista”, resume ao SAPO24 Adriana Scartaris, e “pareceu-me fundamental que a arte tivesse algum papel em resignificar aquele mundo e se possível tornar alguma coisa melhor”.
A forma de o fazer foi primeiro individual e depois coletiva. Individual na procura de uma referência cujo percurso pudesse ter significado para artistas no contexto contemporâneo – e a figura encontrada foi a de Frida Khalo. “Estava à procura de força e de energia para a capacidade de criar e essa energia da criação é intrinsecamente muito forte na mulher. Gestar, parir e cuidar do outro são verbos associados ao feminino, mas também à arte numa forma conceptual”.
É com a figura de Frida Khalo como referência que o projeto que nasceu para fortalecer artistas se tornou coletivo com a ideia de fazer um concurso e de trazer a temática para Lisboa através do Coletivo 284, espaço de galeria e curadoria de que Adriana é sócia.
A primeira IMPERFEITA acontece quase um ano depois, em 2021, mas ainda sob o signo da pandemia, tendo inclusive adiado a data de lançamento, há exatamente dois anos, por razões que se prendiam com o confinamento e as limitações de circulação em espaços públicos. Mas foi essa data, afirma Adriana, que marcou “um ponto de viragem enquanto artista, curadora e empreendedora”.
A exposição de 2021 marcou o início de um ciclo de três sob o mote da imperfeição e, em particular, da imperfeição no feminino.
"A tua imperfeição te torna única”
Porquê imperfeita? “Porque acredito na imperfeição enquanto algo genuíno e que torna alguém autêntico, original e único”, responde a curadora. “Imperfeita é uma palavra muito forte para Frida Khalo quando ela afirma ‘eu sou imperfeita, todas as mulheres são imperfeitas’. A tua imperfeição te torna única”.
Em 2023, acontece a IMPERFEITA 1.3 que abre portas esta quarta-feira, 8 de março, no Coletivo 284 em Lisboa. A terceira edição da exposição traz um novo tema, uma novo alvo da imperfeição, sobretudo nas mulheres: a idade.
“A idade é um tabu, infelizmente. Mas se a imperfeição te torna única, a tua idade não te define. Não existe uma gama de comportamentos para definir ou limitar uma mulher, seja qual for a idade”, explica Adriana Scartaris que assume como propósito artístico e de intervenção “construir a cada ano um manifesto”.
“Eu sou uma mulher de 60 anos e muito tranquila com a minha idade, não teria vontade de voltar para os 30, porque sou resultado da história que vivi. A idade para mim é um orgulho, não me define enquanto impedimento de fazer uma coisa, define-me sim no potencial e naquilo que eu aprendi. É essa a mensagem que eu quero passar”.
Uma mensagem que convoca mais uma figura, desta vez Madonna, um ícone da música pop contemporânea, como agente de provocação e inspiração aos artistas que participam na exposição.
Uma escolha que se funde no propósito desta edição de abordar a idade como o último tabu sobre as mulheres, aquele que nenhuma revolução ainda derrubou. Madonna surge neste contexto pelo seu percurso de liberdade de escolher como se envelhece, desafiando os estereótipos.
“A idade não nos define” é o claim para a IMPERFEITA 1.3, uma exposição que reúne assim quase 90 obras de mais de 30 artistas de diferentes nacionalidades, numa seleção feita por convite e por candidatura. Entre os artistas que irão ter as suas obras patentes nesta exposição, destaque para nomes como os portugueses Daniela Guerreiro e Rui Carruço, os italianos Fiumani e Tony Cassanely ou as brasileiras Alessa Baggio e Fernanda Victorello.
Conta com quatro projetos especiais - Collab David Reis Pinto e AFID; Collab Tim Madeira e Quinta Essência; Projeto Avatar - Adriana Scartaris; e a Instalação Interativa Atelier Frida Kahlo - Bruno Maltez.
A exposição tem ainda uma dimensão de Inclusão, com obras da autoria de oito coautores portugueses apoiados organizações de cariz social – Fundação AFID diferença, Fundação Liga e Associação Quinta Essência - e cujo valor da venda reverte na totalidade para estas instituições
Um mergulho no mundo de arte pós-internet
A tecnologia aliada à arte foi desde a primeira edição uma das propostas e este ano essa interseção dá mais um passo com o lançamento da exposição no metaverso. Algumas obras integram realidade aumentada, outras são criadas por Inteligência Artificial, sendo “editadas” depois por artistas humanos.
A artista e curadora sublinha que o aprofundamento da interseção entre a arte e a tecnologia “foi um mergulho neste mundo de arte pós-internet que explora o impacto da tecnologia e questiona a relação entre o mundo físico e o mundo virtual”, lembrando que a “Inteligência artificial não é tradicionalmente considerada uma forma de arte, mas pode ser utilizada para criar e interagir com a arte de outras maneiras”.
A IMPERFEITA 1.3 serve ainda de cenário a um conjunto de iniciativas, com datas agendadas em todo o mês de março, com destaque, entre outras, para um pequeno-almoço intimista para imersão na exposição e potenciação do cheiro e sabor ou para uma conversa do avesso que tem como objetivo desconstruir temas corporativos abordados à luz de estereótipos.
“A IMPEREFITA 1.3 que valoriza as imperfeições de todas as mulheres, como potências e características que as tornam únicas, amplia a reflexão sobre “ser mulher”. Os artistas participantes podem explorar esses dois símbolos contemporâneos individualmente ou em conjunto, revisitando o papel da mulher na sociedade”, resume Adriana Scartaris.
A exposição pode ser vista a partir de hoje e até dia 16 de abril e estará aberta ao público às sextas, sábados e domingos, entre as 14h00 e as 19h00. A entrada é gratuita.
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