“Uma outra Bela Adormecida” é o título do espetáculo criado por Beatriz Brás, Martim Sousa Tavares e Francisco Lourenço, a partir do texto que Agustina Bessa-Luís escreveu em 1999, numa reinterpretação do clássico de Charles Perrault, e que vai estar em cena de 12 a 22 de janeiro.
Inserido nas comemorações do centenário de Agustina Bessa-Luís (1922-2022), o espetáculo segue o texto original, em que a escritora “acrescentou e problematizou algumas questões da Bela Adormecida” e que agora ganha forma em palco, explicou à Lusa Martim Sousa Tavares, que assina a composição e a direção musical.
“A Agustina, como ela própria refere, insere-se numa linhagem já muito longa de autores que abordaram este conto que tem centenas de anos […] e há ali algumas pontas soltas que são interessantes pensar. Uma delas é a questão, por exemplo, de uma pessoa estar a dormir e ser acordada com um beijo, enquanto dorme, que hoje em dia já não é tão bem vista como seria e pode ser uma coisa cómica, como pode ser problemática”, afirmou.
No fundo, os três criadores da peça agarraram no texto que Agustina Bessa-Luís escreveu, “que tem uma certa estranheza, que tem duplas leituras” e levaram-no para a cena.
Para tal, foi necessário fazer uma ligeira adaptação para palco, na medida em que o texto que Agustina escreveu é um texto para ser lido e não um texto teatral, nomeadamente a passagem para discurso direto.
Além das interpretações — com Beatriz como narradora e personagem principal — vão ser projetadas imagens no fundo do cenário, um trabalho da responsabilidade de Francisco Lourenço, que complementam “alguma da imagética que está a ser mencionada”.
“Fala-se numas colheres de ouro que são tão pesadas que os personagens não conseguem trazê-las até à boca, portanto ali podem aparecer umas colheres, que depois se transformam numa farpa, que vai espetar-se no dedo da Bela Adormecida, portanto são sempre imagens entre o abstrato, o desconcertante e o cómico também, que vão estimular a imaginação de quem ouve”, explicou.
Martim Sousa Tavares destacou que nunca são projetadas imagens de personagens, de pessoas, porque isso iria embater naquilo que já se está a ver.
“É uma complementaridade, e a música faz a mesma coisa também, a música também está ali para pontuar a estranheza, para pontuar alguns momentos, como, por exemplo, uma cena em que vão todos para a guerra ou uma cena em que ficam todos a dormir, a música está lá para fazer essa cama”.
Para interpretar a música estarão em palco quatro músicos, da Orquestra Sem Fronteiras, que tocam cinco ou seis instrumentos cada um, dando uma “diversidade muito colorida naquilo que são as soluções” apresentadas.
Há ainda o recurso a pedais de ‘loop’, que é um efeito em que um músico toca e o pedal fica a tocar aquilo que ele tocou.
Ou seja, “o músico pode tocar qualquer coisa diferente por cima disso, o que nos dá efeitos muito interessantes quando por exemplo todos adormecem, os próprios músicos adormecem, ficando apenas os pedais a tocar sozinhos, uma brincadeira também com os automatismos nada humanos das tecnologias da música”.
Em maio, o espetáculo vai ser reposto, com a parte musical a ser interpretada pelos alunos da Orquestra de Cordas da Escola da Casa Pia.
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