'A Noite', lançada pela primeira vez em 1979, é a primeira peça de teatro escrita por José Saramago, único Nobel da Literatura da língua portuguesa, numa encenação que pretende recriar as vivências da noite do 25 de Abril dentro da redação de um jornal da capital lisboeta.

O protagonista Diogo Morgado falou com o SAPO24 e sublinhou que "esta foi a primeira peça escrita por José Saramago, e é encenada pela terceira vez aqui no Centro Cultural Malaposta. Conta a história daquilo que se viveu numa redação na noite de 24 para 25 de abril de 1974. Fala sobre aquilo que era a censura e como se vivia dentro de uma redação, quem era pró-governo, quem era contra o governo, quem era de esquerda e quem era de direita".

"Numa noite tão importante como esta, em que a grande maioria da população não fazia ideia do que aconteceu, a necessidade de ter as notícias cá fora era muito importante. Aqui falamos da direção da redação a favor do regime e o lado dos redatores que são conta o regime, de esquerda e que querem escrever o que se está a passar", detalha.

Acrescenta ainda que a peça ganha mais importância nos 50 anos do 25 de abril.

"A minha personagem é o Manuel Torres. É um redator da província e é alguém que é provavelmente um dos jornalistas mais antigos da redação Diz-se que terá o seu talento para ser jornalista, mas opta por ser redator da província porque não quer escrever nem uma linha que seja a favor do regime. Então, ele pede para passar para aquele lugar e passa independentemente do seu talento", adianta. "É uma personagem que está contra o regime e, no fundo, vai servir de peça de ação naquilo que vai ser o Movimento das Forças Armadas dentro da redação do Jornal de Lisboa". 

Sobre interpretar um texto de Saramago, destaca que "a peça teve que ter uma pequena adaptação, porque existem mais personagens no original. Aqui são só nove, no original são cerca de 14, algumas com representações muito pequenas. Mas, na verdade, o texto do Saramago está todo lá e o mais chocante é percebermos que 50 anos depois está mais vivo do que nunca. Existe esta tentativa constante de passar a mensagem para os dias de hoje".

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A peça acontece numa redação de um jornal, em Lisboa, na noite de 24 de abril de 1974, em que a rotina é interrompida pela discussão entre o redator da província, Manuel Torres, e o seu chefe de redação, Abílio Valadares, interpretado por Luís Pacheco, um homem submisso ao poder político, que aceita a censura aos textos sem questionar e que conta com o apoio incondicional de Máximo Redondo, representado por João Didelet, o diretor do jornal.

Torres, a personagem de Diogo Morgado, não tolera a ideia de o jornal ser constantemente manipulado por terceiros, e está em constante luta ideológica com a chefia. Tendo como aliados Cláudia, interpretada por Sara Cecília, uma jovem estagiária, e Jerónimo, Jorge Corrula, o linotipista e chefe do turno da noite, o conflito ganha uma dimensão ainda mais dramática quando surge na redação o boato de que poderá estar a acontecer uma revolução na rua.

O chefe de redação proíbe que se publique qualquer notícia sobre o tema e, nesse momento, a agitação e o nervosismo crescem no
seio do jornal, com Torres e Jerónimo a exigirem que se confirme a veracidade dos factos e que os mesmos sejam notícia de primeira página no dia seguinte.

Do outro lado da “barricada”, o diretor e o chefe de redação vão fazer tudo para desvalorizar a alegada convulsão social, na certeza de que não irão imprimir notícia alguma, nem que para isso tenham de alegar uma avaria nas máquinas dos linotipistas.

Neste momento, instala-se uma micro revolução na redação e a incerteza cresce até que se consiga provar o que poderá estar a
acontecer na rua. Mesmo depois de provados os factos, qual será a verdade que irá vencer? Haverá alguma notícia na primeira página da edição do dia seguinte? É o que o espetador é convidado a descobrir.

Ao longo de toda a ação, o contínuo do jornal, Faustino, João Redondo, que sabe mais do que aparenta e tenta manter uma atitude neutra, tenta desconstruir alguns dos conflitos vividos na redação. Faustino é coxo de nascença e o seu andar atípico, que lhe dificulta a atarefada profissão de contínuo, visa ironizar sobre o estado do país e a velocidade com que o mesmo avança.

Esta peça conta com as interpretações de atores da ficção e de palcos nacionais como Diogo Morgado, Jorge Corrula, João Didelet, Luís Pacheco, Elsa Galvão, Ricardo de Sá, Henrique de Carvalho, Sara Cecília e João Redondo.

A peça vai estar em cena no Centro Cultural Malaposta até dia 2 de junho, tendo já algumas das próximas sessões esgotadas. Os bilhetes podem ser adquiridos aqui e custam 25 euros. Os munícipes de Odivelas podem usufruir de 20% de desconto.