Se é um leitor que tem sede de chegar ao seu destino de férias, no Algarve, e que se prepara para "voar" pela autoestrada, com uma breve paragem numa estação de serviço apinhada de gente com carros atolados de bagagem, bicicletas e alguns barcos de recreio, então as linhas que se seguem...são exatamente para si. Para si e para todos aqueles que decidiram, em agosto, rumar a sul, destino de eleição, há muito, de muitos de nós.
Este ano parece haver uma novidade: os Pókemon decidiram também ir de férias para o Algarve. No mundo da virtualidade imagine agora que são vários que se espalham todos para sul, à nossa frente. Por isso, siga-os e tente apanhar, pelo menos, aquele que vai de férias consigo. É este, o jogo que lhe propomos a seguir.
Para lá chegar podemos partir dos vários pontos cardeais do nosso rectângulo continental. Mas, para facilitar e porque não somos centralistas, a viagem aqui desenhada não se restringe a quem parte do Terreiro do Paço. Faz-se um pouco mais a sul de Lisboa, já do outro lado do rio Tejo. Sem ser a régua e esquadro, traçamos uma linha, mais ou menos horizontal e transversal, que rasga o Alentejo, partindo o país em dois.
Em jeito de cascata, o boneco virtual segue as rotas alternativas que o asfalto das estradas nacionais nos proporciona para chegar ao destino. De Sagres a Vila Real de Santo António, passando por Albufeira, no Barlavento ou Sotavento, na praia que escolheu estender a toalha ou numa qualquer vila na serra algarvia, se for esse o local eleito.
Por estas vias tudo será feito com tempo, aproveitando-o ao máximo. O imenso sol será nosso fiel companheiro, bem por cima das nossas cabeças ou do nosso lado direito. São também rotas para quem gosta e quer apreciar as várias e diversas paisagens que tem pela frente. Seja pelo litoral, interior ou a que segue o curso do rio Guadiana.
Há paragens obrigatórias. Canal Caveira a Alcoutim, praias no litoral alentejano, vilas alentejanas em que o tempo demora a passar, ou na estrada da serra do Caldeirão, onde cabines telefónicas da Portugal Telecom denunciam tempos de outrora. Pelo caminho, há nomes de terras de trazem à memória Minas de outros tempos que nos são familiares, umas encerradas outras recuperadas.
A paisagem é bucólica e diversificada. Há o amarelo torrado do Alentejo. O verde das serras e dos Parques Naturais. Observamos campos de milho, girassóis, olival, gado em pastagem e pás eólicas que com um toque de modernidade ajudam a pintar o quadro que nos espera. Há restaurantes de estrada e placas a anunciar fruta à venda. Há carros e camiões em movimento, estradas completamente vazias salpicadas por coelhos e gatos, sinais de limites de velocidade nas localidades que nos obrigam quase a parar no tempo e bicicletas com ciclistas que parecem terem perdido o pelotão da Volta a Portugal.
Nas vilas e aldeias, portas e janelas impedem o calor tórrido de entrar e as esplanadas de alguns cafés convidam viajantes e idosos locais a partilharem silêncios.
Comecemos então com a estrada nacional mais conhecida e frequentada. É um percurso que tem complementar no nome, mas que nesta altura tem estatuto de principal.
IC1: Canal Caveira já tem minimercado
Em Alcácer do Sal, os ninhos que as cegonhas edificam servem de inspiração para a viagem que começou uns quilómetros mais atrás e nos guiará, em modo de voo plano pela planície, até ao Sotavento ou Barvalento algarvio.
Já foi a principal paragem, já perdeu o estatuto, esteve quase a sair do mapa e voltou nos anos mais recentes a ser (quase) aquilo que foi. Falamos de Canal Caveira, uma reta de cafés, restaurantes e do minimercado, que se alinham no sentido norte-sul, isto é, inclinado só para quem desce para o Algarve. Do lado inverso um imenso parque de estacionamento e uma ponte pedonal que parece servir de decoração, tantos são aqueles que arriscam a travessia mais direta ao café que está à mão de semear. Com estômago atestado, cumpre-se uma tradição. Mas, se quer acrescentar algo mais profundo da região, a seguir a Grândola, antes de Ermida do Sado, faça um desvio até as Minas de Lousal (minas de Pirites, já extinta) e revisite a história da vila no Museu Mineiro e no Centro de Ciência Viva do Lousal ou coma no restaurante Armazém Central.
Rode a chave da ignição de novo que é tempo de acelerar, porque as férias não esperam. Com mais ou menos tráfego, siga até Ourique, suba até Santana e São Marcos da Serra, e em São Bartolomeu de Messines ou desvia para Silves (N124) ou segue a linha do comboio até Tunes, Ferreiras, Albufeira. O mar está ali à vista. Passou rápido.
Seguindo o curso do Guadiana pela N122
Para o Pókemon que vem de Évora, passando pelas terras de vinho – Portel e Vidigueira –, em direção a Beja, não apanha o avião, antes calcorreia o asfalto e faz o desvio para Mértola e para o Parque Natural do Vale do Guadiana, pisando, mais à frente, a N122. Um desvio às Minas de São Domingos poderá fazer parte da sua rota. Com os semáforos e sinais a obrigarem à velocidade de 50 km/h no concelho de Mértola, em Vale do Açor de Cima, as cabines telefónicas com a insígnia Portugal Telecom levam-nos a quase parar como a recuar no tempo. E por falar em passado, a seta Pulo do Lobo aviva a memória política de tempos passados escritos na então jovem democracia.
A seguir a Santa Marta é merecido o desvio, e pausa, em Alcoutim. Dai, pela estrada 122-1, quase que basta esticar o nosso braço esquerdo e tocamos no rio Guadiana e na vizinha localidade espanhola de Sanlucar de Guadiana. Serpenteie por essa estrada fora até Castro Marim (retomando aí o IC-127) ou siga pelo Azinhal e Junqueira até Vila Real de Santo António, onde desagua em algumas rotundas que ligam à famosa nacional 125. Chegamos, então, à ponta mais a leste do sotavento algarvio.
Por entre Minas na N2
Montemor-o-Novo marca outro ponto de partida deste jogo real que lhe apresentamos de chegar às praias algarvias por estradas sem portagens e com (obrigatórias) paragens que não têm preço.
Pela N2 siga até Santiago do Escoural. Na N2 contabilize Alcáçovas, Torrão, Odivelas, Ferreira do Alentejo – zona do imenso olival com o cunho Oliveira da Serra –, Ervidel, até aterrar num famoso eixo de Minas, das de Almina às de Neves Corvo: Aljustrel, Castro Verde e Almodôvar. Por aqui há algumas áreas de descanso que parecem elas mesmas estarem a viver esse estado de espírito de uma aparente imutabilidade eterna.
Nas imensas retas que antecedem a Serra do Caldeirão, alguns ciclistas vestidos a rigor parecem saídos da Volta a Portugal, mas não passa de pura ilusão. E talvez só com um truque de magia, perto de Barranco-o-Velho e Vale das Três Marias, uma antiga "Casa de Cantoneiros" da Junta Autónoma de Estradas, datada de 1936 arranjará comprador. Se andava à procura de uma, bom já deu por bem empregue a viagem. E por falar em oportunidades, em Besteiros encontra uma seta com as palavras "licor de medronho". É parar, comprar e beber, só depois de já sentadinho e bem instalado, se faz favor. São Brás de Alportel marca um triângulo de soluções. Para Loulé com passagem por Querença pela N396, seguir em frente até Estói e Faro ou virar à esquerda (N270), para Tavira, fazendo parte da Algarviana. E por aqui ligue-se, por via transversal, quase até ao mar da costa Vicentina.
Pelo parque natural do sudoeste alentejano e Costa Vicentina
Aqui chegados, já fomos para o Algarve por três estradas nacionais. Mas há ainda um último itinerário. Recuemos até ao rio Sado. Em Setúbal, podemos apanhar o barco e navegar até à Comporta. Daí seguir pela N261-1 até Grândola ou, junto à costa, saltar até Melides (N201) e daí até Santiago do Cacém para apanhar a N120, vinda da "terra da fraternidade".
Nesta estrada nacional, o Cercal é o próximo ponto de referência geográfica. Aí, de novo, duas hipóteses: ou seguimos pela serra do Cercal ou apanhamos o ar marítimo de Vila Nova de Mil Fontes (N390), para depois seguirmos para Odemira (pela N393) e retomar a nossa rota que nos levará a Odemira. A partir desta vila, entramos no Parque Natural do Sudeste Alentejano e Costa Vicentina. Carros com pranchas de surf empilhadas, para cima e para baixo, saltitando pelas imensas e belas praias da Zambujeira do Mar, Odeceixe e Aljezur. Uns quilómetros mais à frente, as curvas e contra curvas da Serra Espinhaço de Cão curvas levam-nos até Bensafrim e terminam em Lagos. Se tiver tendência para enjoar e porque a viagem já está quase no fim, opte antes pela estrada junto ao atlântico, pise as encostas da Bordeira e Carrapateira, aviste as pás eólicas que denunciam que estamos a chegar ao nosso destino, faça o desvio em Vila do Bispo (N268) e desagúe em Sagres. A ponta mais ocidental de Portugal continental e do Barlavento.
Chegamos. Apanhamos o último Pókemon. Como prémio nada melhor que um mergulho nas refrescantes águas desta ponta do Algarve. Ponto final destas linhas que nos levaram ao Algarve.
Rebobine, agora o filme. Regresse ao ponto de partida e pense antes de optar. Poderá ir pela via mais rápida, a 120 km/h, com os olhos fixos no carro da frente ou seguir os quatro caminhos que lhe apresentamos, por estradas nacionais e alguns troços regionais, traços bem vivos do passado e do presente e que nada têm de virtualidade.
Para o fim, um conselho: deixe o boneco da realidade aumentada em casa e desfrute de tudo o que o rodeia até chegar ao seu destino de férias. E aí chegado, desligue a chave da ignição e aproveite os dias para carregar baterias. As suas baterias.
Boas férias.
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