Quando o Presidente da República, Jorge Sampaio, dissolveu a Assembleia da República, a 22 de dezembro de 2004, fazendo cair o Governo e marcando eleições para 20 de fevereiro de 2005, José Manuel Canavarro, secretário de Estado Adjunto e da Administração Educativa, e José Maria de Almeida, diretor regional de educação de Lisboa, ficaram “a saber em que momento cessariam funções nos cargos que ocupavam e que importava definir o seu futuro”, refere a acusação do Ministério Público (MP), a que a agência Lusa teve hoje acesso.
Antes, "em outubro ou novembro", cinco administradores do grupo GPS, também constituídos arguidos neste processo, conseguiriam uma reunião na Secretaria de Estado da Administração Educativa, na qual invocaram, junto de José Manuel Canavarro e José Maria Almeida, “a situação de rutura do parque escolar de Mafra e Caldas da Rainha, concelhos onde se propuseram construir quatro colégios, “desde que o Estado garantisse o seu financiamento através da celebração de contratos de associação”.
Contudo, a queda do Governo acelerou a tomada de decisões em relação a este processo.
“Assim, [...] entre os últimos dias do mês de dezembro, e os primeiros do mês de janeiro de 2005, os arguidos firmaram o acordo que satisfazia os interesses económicos dos arguidos António Calvete, Fernando Catarino, Agostinho Ribeiro, Manuel Madama e António Madama, administradores do GPS, e dos decisores públicos, os arguidos José Manuel Canavarro e José Maria de Almeida, em termos de futuro próximo, quando cessassem funções públicas, o que já estava previsto”, refere a acusação.
O acordo definia que aos administradores do grupo GPS cabia apresentar os requerimentos necessários à abertura dos quatro novos colégios privados, que funcionariam com recurso a financiamento público, por via de contratos de associação, “bem como ao incremento de número de turmas e abertura de novo ciclo de ensino secundário, abrangidas por contrato de associação já existente com o Colégio Infante Santo (distrito de Santarém)”.
“Os arguidos José de Almeida e José Canavarro garantiram que as pretensões dos arguidos [administradores] eram aprovadas antes de cessarem as funções de diretor regional de educação e de secretário de Estado Adjunto e da Administração Educativa, respetivamente, praticando todos os atos e dando todas as instruções para que os mesmos fossem tramitados de acordo com o combinado entre todos e imprimindo celeridade necessária”, frisa a acusação.
O MP salienta que José Canavarro e José de Almeida, decisores públicos, “atuaram contra o interesse público ao permitirem o aumento de contratos de associação e do número de turmas contratadas, o que fizeram dando rápido seguimento aos pedidos formulados pelos colégios GPS, para que o núcleo fundamental das decisões fosse adotado antes de cessarem as funções exercidas”.
A acusação diz que estes dois arguidos assumiram compromissos com o grupo GPS, “deixando o Estado vinculado a celebrar contratos de associação com os colégios que os arguidos administradores se propuseram criar, com a garantia desse financiamento público, “incluindo-os, por força dos seus parecer e despacho homologatório, na rede escolar para o ano letivo de 2005/2006”.
Contudo, “à data em que proferiram todas as decisões tomadas, tais estabelecimentos de ensino não tinham existência física nem legal, a saber autorização de funcionamento e paralelismo pedagógico, e, no caso, do colégio Infante Santo que não se verificava a situação de carência de rede pública, que o arguido José Maria de Almeida atestou”, sabendo que a construção dos colégios “só avançaria quando tivessem a garantia de que o Estado financiaria o seu funcionamento, através da celebração de contratos de associação”.
Em contrapartida, os cinco administradores “comprometeram-se a assegurar lugares nos quadros das sociedades do grupo GPS para os arguidos José de Almeida e José Manuel Canavarro, logo que estes entendessem iniciar a sua atividade”, tendo ambos recebido ao todo perto de 300.000 euros por serviços prestados ao grupo GPS, de acordo com o despacho de acusação.
Além disso, o acordo previa também que o ex-diretor regional de educação de Lisboa recebesse “participações sociais de valor económico em sociedades detidas pelo grupo GPS, designadamente 7,5% do capital social do Colégio Rainha D. Leonor” e um investimento financeiro “por parte do grupo GPS na Escola Internacional de Torres Vedras, à qual esteve ligado o arguido José Maria de Almeida, através de uma sociedade”, pode ler-se na acusação.
No arranque do ano letivo de 2005/2006, em setembro de 2005, o arguido José Maria de Almeida iniciou funções na Escola Internacional de Torres Vedras, enquanto gestor pedagógico e representante o grupo GPS.
No final de 2008, o ex-diretor regional assumiu a direção do Colégio Oriente (Lisboa), unidade escolar pertencente ao Grupo GPS, cargo que manteve até 2013.
De 2005 a 2009, José Maria de Almeida recebeu das diversas sociedades do GPS mais de 68.000 euros.
Já o arguido José Manuel Canavarro iniciou funções de consultor do Departamento Pedagógico em sociedades do Grupo GPS, ainda em inícios de abril de 2005.
A acusação refere ainda que os arguidos tiveram assento no conselho estratégico numa sociedade do grupo GPS, logo desde a sua conceção, em junho de 2005, na antecipação da abertura do ano letivo de 2005/2006.
Pelas funções de consultoria, a partir de 2005, José Manuel Canavarro recebeu quase 220.000 euros.
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