Esta posição foi transmitida em plenário pelo dirigente bloquista e vice-presidente da Assembleia da República José Manuel Pureza, num debate em que a ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, defendeu a tese de que a proposta do executivo sobre acesso a metadados "está de acordo com uma interpretação atualista" da Constituição da República.
Após a ministra da Administração Interna ter procurado sustentar que a proposta do Governo "respeita os princípios constitucionais da proporcionalidade, da adequação e da necessidade" e, ainda, concilia "no plano prático os direitos fundamentais da segurança e o direito ao sigilo das comunicações", José Manuel Pureza defendeu a tese oposta e considerou mesmo estar-se perante "duas falsidades".
"A primeira falsidade é quando se diz que em Portugal não se dispõe de meios contra o terrorismo, quando a Polícia Judiciária já pode aceder a comunicações desde que no âmbito de processo criminal. A segunda falsidade é a de que tem de haver sacrifício de aspetos essenciais da legalidade democrática para se combater com eficácia o terrorismo - uma perspetiva que é inaceitável", frisou o dirigente do Bloco de Esquerda.
Ciente de que PSD, PS e CDS-PP se prepararam para aprovar na sexta-feira, na Assembleia da República, o diploma do Governo, José Manuel Pureza deixou um apelo dirigido a Marcelo Rebelo de Sousa: "Confiamos que entidades com competência para suscitar a fiscalização preventiva o façam. Este diploma está ferido de inconstitucionalidade", advogou.
O diploma do Governo foi defendido pelos deputados Fernando Negrão (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Pedro Delgado Alves (PS) e Filipe Neto Brandão (PS), este último também membro do Conselho de Fiscalização dos Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP).
Em comum, estes deputados alegaram que, em defesa do Estado de Direito democrático, a Constituição da República baseia-se num "equilíbrio" entre segurança e liberdade e privacidade dos cidadãos.
Ainda segundo estes mesmos deputados, a proposta do Governo permite o acesso a metadados aos agentes dos serviços de informações sob um prévio e apertado controlo judicial (o Supremo Tribunal de Justiça) e, por outro lado, não toca na questão do acesso ao conteúdo das comunicações.
"Vivemos tempos novos que exigem novas respostas", sustentou Filipe Neto Brandão, vice-presidente da bancada socialista, que ainda procurou desmontar o motivo de o acesso a metadados se fazer pelo diploma do Governo fora do processo criminal.
Filipe Neto Brandão alegou, para o efeito, que as funções de recolha e tratamento de informação inerentes aos agentes das suas "secretas" do SIRP se fazem necessariamente "num patamar prévio".
"Ora, é neste patamar prévio que tem de estar a primeira linha da prevenção dos atentados terroristas", afirmou.
Porém, para o deputado comunista António Filipe, ao contrário da linha de argumentação de PS, PSD e CDS-PP, há já uma jurisprudência em Portugal que equipara metadados e escutas telefónicas e, por outro lado, o acesso tem de fazer sempre no âmbito do processo criminal.
"Esta é uma questão incontornável. Não há volta a dar à exigência de processo criminal", advertiu, embora reconhecendo o esforço feito pelo atual Governo para judicializar o acesso a metadados, ao contrário do diploma da anterior legislatura - esse alvo de pronúncia de inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional.
António Filipe deixou também um ataque ao próprio modo como têm funcionado as "secretas" portuguesas em matéria de respeito pela legalidade.
"Estamos a falar de serviços de informações que, até ao momento, não deram provas de credibilidade. Depois, no plano político, recorrentemente, somos confrontados com situações de impasse nas nomeações para o Conselho de Fiscalização do SIRP, deixando esses serviços sem qualquer fiscalização efetiva", acrescentou, aqui numa referência crítica indireta aos desentendimentos entre PSD e PS no parlamento.
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