Mas não foi só a imagem, aliás nem terá sido esse o elemento fundamental da derrota. A defesa dos direitos das mulheres, nomeadamente a defesa do direito ao aborto polarizou ainda mais a sociedade norte-americana. A imagem do homem forte e protetor da mulher em todas as situações, encarnada por Donald Trump mesmo após os casos de assédio sexual, terá ganho o voto dos americanos. Ou talvez a política económica trumpista de baixar impostos e escolher o protecionismo, defendendo os produtos do país.
Ao contrário de Claudia Sheinbaum, que é a primeira mulher presidente do México, Kamala Harris, assim como Hillary Clinton em 2016, Kamala Harris teve a hipótese de se tornar a primeira mulher a ocupar a Casa Branca, mas tropeçou no último obstáculo.
Embora algumas destas ameaças se devam à personalidade e popularidade de Donald Trump, em ambos os casos, a questão da misoginia na sociedade também desempenha um papel importante para muitos observadores.
Misoginia?
Durante a campanha, Harris e Trump demonstraram opiniões radicalmente opostas sobre o papel das mulheres e os seus direitos.
O presidente eleito, que enfrentou várias acusações de assédio sexual - as quais ele nega - projetou uma imagem hipermasculina, paternalista, aparecendo ao lado de campeões de desportos de combate e elogiando líderes mundiais autoritários. No final da campanha, Trump fez também vários comentários criticados como sendo ofensivos e depreciativos em relação às mulheres. Chamou “lunática” e “mentalmente incapaz” a Harris e estimou que, como presidente, ela seria “como um brinquedo” para outros líderes mundiais.
O senador J.D. Vance, agora vice-presidente eleito, repetiu uma piada que fez em 2021 sobre “mulheres com gato sem filhos” governando o país, dizendo: “Não tenho nada contra gatos”.
Trump também se apresentou como um “protetor” das mulheres, dizendo que as protegeria “quer elas gostem ou não”.
Em contrapartida, Harris contou com celebridades femininas como Beyoncé, Jennifer Lopez, Lady Gaga e Oprah Winfrey, apostando que elas a ajudariam a levar a sua mensagem até mesmo para as eleitoras conservadoras.
A democrata não fez uma campanha aberta sobre o fato de poder via a ser primeira mulher presidente dos Estados Unidos, mas fez da defesa dos direitos das mulheres, especialmente do aborto, a pedra angular de sua proposta.
Num discurso de campanha, a ex-primeira-dama Michelle Obama denunciou o aparente duplo golpe em que foram derrotados os três candidatos à Câmara dos Representantes.
“Esperamos que ela seja inteligente e articulada, que tenha uma política clara, que não mostre falta de coragem, que prove repetidamente que o seu lugar não é um fardo”, disse Michelle Obama perante uma multidão.
“Mas não esperamos absolutamente nada de Trump. Nenhuma política clara, nenhuma capacidade de montar um argumento coerente, nenhuma honestidade, nenhuma decência, nenhuma moral”.
O Center for American Women and Politics também observou esse duplo padrão numa declaração sobre a vitória de Trump. Harris foi “formidável” na arrecadação de fundos e “conectou-se com os eleitores”, disse a instituição numa nota. Mas não foi suficiente.
As mulheres ocuparam “todos os cargos políticos nos Estados Unidos. Exceto um”, acrescentou o texto, esperando que ‘o trabalho continue’.
Nos últimos sete anos, de acordo com o American Enterprise Institute, a proporção de homens jovens que acreditam que os EUA foram “longe demais” na promoção da igualdade de género mais do que dobrou.
O Business Inside publicou recentemente um artigo com a evolução da imagem da vice-presidente, agora derrotada, que vale a pena ver.
*Com AFP.
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