Na abertura do debate de urgência no parlamento pedido pelo Chega sobre este tema, André Ventura considerou que as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa “representam uma profunda traição sem paralelo” na história portuguesa.
O presidente do Chega dirigiu-se aos antigos combatentes, retornados e “espoliados das províncias do Império”, considerando que “no saldo do deve e do haver” se houvesse “alguma coisa para pagar” seria “esse mundo fora que teria que pagar a Portugal".
Ventura questionou o Governo, representado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, se “algum dia fará uma diligência” para a reparação às antigas colónias.
Em 27 de abril, dias depois das declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, o Governo já tinha afirmado que “não esteve e não está em causa nenhum processo ou programa de ações específicas com o propósito” de reparação pelo passado colonial.
Pelo PSD, Regina Bastos defendeu que “a liberdade de opinião é o oxigénio da democracia”, lamentando que haja “temas interditos e censura legitimada para alguns que não conseguem aceitar essa liberdade”.
Para o PSD, Portugal tem com as ex-colónias uma relação "sem sobressaltos" e "com exemplares relações institucionais", considerando que só com respeito e reconciliação com o passado comum se pode "cooperar e crescer", sendo a cooperação uma "pedra de toque das relações bilaterais".
“Não foram as declarações do Presidente da República que criaram um tumulto mediático. Quem o criou e continua a alimentar foi mesmo o aproveitamento político que delas foi feito”, acusou.
Já o PS, por Pedro Delgado Alves, criticou “mais uma busca desesperada de atenção” e na qual o Chega “procurou clivagem num tema que é difícil e que merecia mais respeito”, acusando o partido de “falta de noção e falta de respeito pela inteligência" do parlamento e do país.
Considerando que este agendamento não tem um “pingo de urgência”, o deputado do PS referiu que “Portugal pode ainda não ter feito um debate sobre descolonização como outros países”, mas isso nunca impediu a relação de lealdade e respeito.
Paulo Núncio, do CDS-PP, discordou da posição do chefe de Estado, mas não a confunde com um “processo-crime gravíssimo”.
“Não perderei um segundo mais com uma iniciativa que é politicamente insana, juridicamente ignorante e institucionalmente infantil”, disse, numa curta intervenção na qual não usou todo o tempo disponível.
A intervenção de Joana Mortágua, do BE, gerou um dos momentos mais tensos, quando subiu ao púlpito perante sons da bancada do Chega e perguntou: "é tudo medo?".
“O tema das reparações históricas ganhou espaço no debate público. A Europa está a lidar com o seu passado. (...) A escolha que temos de fazer é entre acompanharmos este debate europeu ou ficarmos amarrados à propaganda antiga", defendeu.
A bloquista afirmou que se fosse levada a sério esta queixa “o Presidente arriscaria 10 anos de prisão” perguntando se essa “é a pena para quem tem uma opinião diferente” do Chega.
Pelo Livre, Rui Tavares disse que os termos usados pelo Chega “indicam um total desrespeito e ignorância sobre a história de Portugal”.
Para Tavares, o que Ventura fez do púlpito a dizer que deviam ser as ex-colónias a pagar barragens ou pontes é um discurso que corresponde ao de Putin sobre a Ucrânia.
Pelo PCP, António Filipe criticou um debate que só serve para o Chega “ter mais umas horas de tempo de antena nas televisões".
“A par da valorização de acontecimentos e processos que se inserem na marcha de progresso da civilização humana, não se pode contemporizar com o branqueamento do colonialismo, da escravatura e do fascismo”, disse.
Pela IL, Rui Rocha considerou que há “reparações históricas, reações histéricas e também reações hipócritas”.
Nas reações histéricas, está a intenção do Chega que o “Presidente da República seja condenado a uma pena de pisão entre 10 a 20 anos”, considerando que Ventura “é jurista e tem obrigação de saber da absoluta falta de fundamento do que pretende fazer”.
No lado da hipocrisia estão as “imputações coletivas de culpa”, aproveitando para perguntar a Ventura se subscreve as palavras do cabeça de lista do Chega às europeias sobre teorias da conspiração, afirmando que o líder do Chega “em casa é um cordeirinho e aqui promove o circo”.
Pelo PAN, Inês Sousa Real acusou o Chega de “usar o parlamento de forma abusiva” e disse que os “50 deputados no parlamento não querem resolver os problemas, só querem escândalos, lutas na lama”.
As declarações do Presidente da República em causa, sobre o período colonial, feitas num encontro com órgãos de comunicação social estrangeiros, em 23 de Abril, são as seguintes: "Nós somos responsáveis por aquilo que lá fizemos, e continuamos. Não é pedir desculpa e passou, ficamos amigos, não. O que fizemos lá, nos massacres, teve custos. Há que pagar os custos. Ainda é possível pagar hoje, paga-se. Trata-se de bens que foram espoliados e não foram devolvidos, quando se provou que eram espoliados. Então vamos ver como é que se consegue fazer a reparação disso".
Nos termos do artigo 308.º do Código Penal, comete o crime de traição à pátria, "aquele que, por meio de usurpação ou abuso de funções de soberania: a) tentar separar a mãe-pátria ou entregar a um país estrangeiro ou submeter à soberania estrangeira todo o território português ou parte dele, ou b) ofender ou puser em perigo a independência do país".
O artigo 328.º do Código Penal estabelece que "injuriar ou difamar o Presidente da República" constitui crime de ofensa à honra do Presidente da República e "é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa", e quando "a injúria ou a difamação forem feitas por meio de palavras proferidas publicamente", a pena agravada para "de 6 meses a 3 anos ou com pena de multa não inferior a 60 dias".
No mesmo artigo, prevê-se que "o procedimento criminal cessa se o Presidente da República expressamente declarar que dele desiste".
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