“O programa mostra uma situação de desespero de quem, de um momento para o outro, é confrontado com enormes necessidades e sem respostas. Num dado momento é preciso encontrar uma solução e, então, deitam mãos a tudo de uma forma global”, afirmou Guilherme Vilaverde em entrevista à Lusa a propósito dos problemas da habitação atualmente existentes em Portugal.
Na sua opinião, o Mais Habitação visa "recuperar o tempo perdido” de uma “falta de estratégia” no setor que não é apenas deste Governo de António Costa, mas dos executivos dos últimos 20 anos.
E acrescentou: “O Governo vê-se desesperado e avança em várias frentes.”
Quanto às cooperativas de habitação, Guilherme Vilaverde considerou as medidas previstas no programa “muito parcas”, sem, contudo, pôr em causa a “boa intenção” das mesmas.
Para o presidente desta cooperativa de Matosinhos, é positivo o Governo prever a disponibilização de solos ou edifícios públicos para construção ou reconversão de casas para arrendamento acessível às cooperativas, mas tem de ser mais do que uma proposta.
Isto porque, ressalvou, tendo em conta o padrão atual de necessidades que existe, estas medidas vão ser “uma pitada, uma pedrada no charco”.
Além da dificuldade que antevê de colocar em marcha um movimento de cooperativas de habitação, Guilherme Vilaverde lembrou que casas não são coisas que se façam de um dia para o outro.
O dirigente sublinhou que, nos últimos anos, as cooperativas não têm estado e não estão na moda porque perderam as suas condições de trabalho.
Mas, frisou, o problema não é só esse, é também a falta de motivação das pessoas em querer fazer parte da solução.
“As próprias pessoas hoje também não estão tão motivadas, estão como que adormecidas à espera que alguém lhes resolva o problema da habitação”, salientou Guilherme Vilaverde.
E para que as cooperativas voltem a ter importância é fundamental que as autoridades lhes deem um “empurrão” e não apenas “manifestações de boas intenções”, considerou.
Por isso, defendeu a criação no Ministério da Habitação de um departamento que trabalhe diretamente com as cooperativas para que estas relancem ou iniciem a sua atividade.
No seu entender, o desaparecimento das cooperativas do mercado de promoção de casas a custos controlados para a classe média foi uma “grave lacuna”. E, neste momento, há uma emergência no retorno das cooperativas, mas isto só será possível se de facto houver primeiro um conhecimento profundo de como se pega nestas, algo que não se faz de cima para baixo, concluiu.
A Cooperativa prepara-se para, no início do próximo ano letivo, abrir uma residência universitária para 21 estudantes.
À gestão de mais de 4.000 casas, lar de idosos, centro de dia, creche, apoio domiciliário, auditório, parque e piscina, a cooperativa acrescenta agora a esta lista uma residência universitária, denominada “Casa do Estudante”, com 21 camas distribuídas por quartos duplos e triplos, contou ainda Guilherme Vilaverde.
A residência, que nasce na Senhora da Hora, num antigo ginásio que o tempo tornou ultrapassado, teve um investimento de 400 mil euros e visa responder a uma “enorme dificuldade e lacuna” na sociedade, referiu.
“Um grande número de estudantes deslocados das suas terras não consegue alojamento digno e é, muitas vezes, vítima da enorme especulação que grassa no país, sobretudo nos grandes centros urbanos”, frisou.
Daí, acrescentou, a importância desta residência que está toda equipada e cuja mensalidade, que rondará os 300 euros, inclui as despesas com água, luz, internet e limpeza.
Guilherme Vilverde salientou que o objetivo deste equipamento, tal como os restantes que gere, não visa o lucro, mas a qualidade de vida e o sentido de comunidade, algo que caracteriza e diferencia as cooperativas - um sentimento que ao longo do tempo se foi perdendo, assim como a participação cívica e popular, lamentou.
O dirigente da Cooperativa de Habitação As Sete Bicas atribuiu a perda da “mística” do sentimento de vida em comunidade nas cooperativas às mudanças na sociedade e às vivências atuais.
Na sua opinião, as novas gerações têm a ideia de que alguém irá resolver por elas os problemas, nomeadamente os da habitação.
Da mesma forma que os professores se têm manifestado para lutar por aqueles que consideram ser os seus direitos, Guilherme Vilaverde entende que também as novas gerações devem constituir-se como solução para o problema.
“O projeto cooperativo, a ideia de participação cívica e a ideia de se constituírem como pequenos grupos e como uma solução estão a faltar”, considerou.
É necessário construir nova habitação, mas os entraves e as limitações são “imensas”, desde a falta de terrenos ou os preços elevados dos que estão disponíveis, a falta de materiais e o custo da mão-de-obra, especificou, lembrando que há 14 anos que a Cooperativa Sete Bicas não constrói nada.
“Eu estou a [achar] muito difícil que na próxima década sejam possíveis grandes evoluções neste campo, daí eu defender que compete ao Estado e às autarquias, se querem ter no setor cooperativo um aliado forte na promoção de respostas habitacionais em condições acessíveis, impor a criação de mecanismos”, concluiu.
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