“Estas situações e o que veio a público são motivo de atenção e preocupação por parte dos nossos associados”, escreveu a AIPIM, numa declaração enviada hoje à Agência Lusa.
Em causa está um caso avançado na terça-feira pelo jornal Expresso, e confirmado hoje à Lusa por um dos comentadores do painel do programa de debate em língua portuguesa “Contraponto”, emitido pela TDM.
O canal público de rádio e televisão de Macau, com emissões em português, cortou declarações sobre Tiananmen do debate pré-gravado, difundido em 30 de maio, tendo também eliminado reportagens da versão ‘online’ do Telejornal em português, transmitido no dia 04 de junho, data em que se assinalava o 32.º aniversário do massacre.
Na segunda-feira, a TDM confirmou, em resposta a questões “de um órgão de comunicação social”, que “foi decidido remover o comentário” do programa semanal Contraponto, gravado em 28 de maio, alegando que “os comentadores opinaram sobre um processo que decorria no âmbito do Tribunal de Última Instância”, sobre um recurso apresentado pelos organizadores da vigília, após a proibição da polícia, “e, do qual, não havia ainda uma decisão final”.
“Assim, tendo a TDM em consideração que não é conveniente fazer quaisquer comentários ou emitir opiniões sobre casos cujo processo judicial ainda se encontre em curso, foi decidido remover o comentário” do programa “emitido nesse fim de semana”, justificou a estação, um argumento criticado pela AIPIM.
“Objetivamente não vislumbramos motivo que impeça comentadores de se pronunciarem sobre processos em curso nos tribunais, independentemente da natureza dos mesmos e desde que se respeitem as regras e os princípios aplicáveis, como o segredo de justiça ou a presunção de inocência (…), como aliás tem sido prática”, criticou a associação.
“Esta situação, sendo ao que sabemos inédita no referido espaço de opinião e análise, suscita natural surpresa e preocupação”, acrescentou.
Já em relação “ao sucedido no Telejornal”, a AIPIM considerou que seria “positivo um esclarecimento adicional por parte dos responsáveis editoriais”.
Dois comentadores do programa de debate em língua portuguesa “Contraponto” deixaram a emissão em protesto contra a “censura” a comentários à proibição da vigília de Tiananmen, disse hoje à Lusa o advogado Frederico Rato.
Nos comentários eliminados, o jurista defendia que a proibição da vigília violava a Lei Básica, a mini-constituição do território, e que esta “corria o risco de passar a letra morta”, prenunciando “o princípio do fim da [sua] aplicação”.
O jurista, que considerou o incidente “completamente inédito”, contestou ainda as justificações da estação.
“Eu não fiz qualquer comentário à decisão de qualquer tribunal, fosse ele qual fosse”, disse, criticando ainda a alegação da TDM de que “não é conveniente” comentar processos judiciais em curso.
“Para já, pode-se falar [sobre processos em curso], os advogados [nas causas] é que não podem, mas eu não estava lá na condição de advogado, e além disso não falei nem um segundo na gravação sobre qualquer decisão de qualquer tribunal”, acrescentou o jurista, há 37 anos em Macau.
No comunicado, a TDM confirmou também que “foi retirada uma reportagem da versão final disponível no website” do Telejornal transmitido em 04 de junho, afirmando que “não tinha sido previamente visionada” e que “a jornalista também não tinha seguido as instruções que lhe tinham sido dadas pelo editor”, acrescentando que “a [sua] inclusão nada acrescentaria em termos de informação”.
De acordo com o Expresso, em causa está uma de quatro reportagens sobre a proibição da vigília transmitidas no Telejornal, com críticas da associação Novo Macau à interdição.
Em março, a TDM foi alvo de polémica, após a administração da estação proibir os jornalistas do serviço de rádio em língua portuguesa de divulgar informação e opiniões contrárias às políticas da China e do Governo de Macau, instando-os a aderir ao “princípio do patriotismo” e do “amor” ao território, tal como a Lusa noticiou.
O caso levou à demissão de pelo menos cinco jornalistas, tendo o Executivo de Macau negado que o território estivesse a impor restrições à liberdade de imprensa.
Nessa altura, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, disse à Lusa que o Governo “esperava” que a China cumprisse a Lei Básica de Macau, “designadamente, (…) em matéria de liberdade de imprensa”.
Esta foi a primeira vez que as autoridades de Macau citaram razões políticas para proibir a comemoração do massacre de Tiananmen.
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