A situação foi constatada pela Lusa durante uma visita ao porto de Maputo, visível no exterior do navio, de bandeira dos Camarões, em que a tripulação se queixa de não ter passaportes ou de não os “mandarem para casa”.
“Por favor espalhem o nosso apelo”, lê-se ainda no cartaz.
A Lusa constatou igualmente que os cinco tripulantes passaram parte da manhã nos serviços de migração da área portuária, mas recusaram prestar qualquer declaração, regressando ao navio, onde vivem há meses em condições precárias. Os marinheiros remeteram qualquer declaração para a Embaixada da Rússia em Maputo, ainda sem qualquer resposta ao pedido da Lusa.
Num pedido de assistência jurídica que o instituto público moçambicano INTRANSMAR, autoridade reguladora do transporte marítimo, enviou em 09 de janeiro ao Tribunal Marítimo de Maputo, face à situação do navio pesqueiro de investigação científica, que acumula dívidas de mais de 400 mil dólares em oito meses no porto da capital moçambicana, e da sua tripulação, são reconhecidas as condições precárias.
No documento, a que a Lusa teve acesso, o ITRANSMAR “reconhece as condições precárias em que os tripulantes vivem a bordo” e pede “que se encetem mecanismos para a melhoria das condições de vida a bordo”, nomeadamente o seu desembarque, mas tendo em atenção que “devem respeitar as disposições” legais, nomeadamente a tripulação mínima para operar o navio, que é o que acontece atualmente.
Numa nota do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, divulgada no domingo pela agência estatal RIA Novosti, refere-se que há cinco pessoas no navio de pesca “Volopas”, de 53 metros de comprimento, já sem combustível ou eletricidade, que duas delas, incluindo o capitão, são russas, e relatando que a tripulação apenas tem comida uma vez por dia.
Acrescenta-se que a tripulação russa transmitiu o desejo de regressar ao seu país e que a Embaixada da Rússia em Moçambique “recorreu imediatamente às autoridades locais para obter assistência”.
No documento enviado ao tribunal, o ITRANSMAR confirma o pedido de assistência da Rússia para o desembarque dos dois tripulares russos, alegando que o agente do navio se recusa a entregar a carta de desembarque aos serviços de migração para efeitos de emissão de visto de tripulantes.
Acrescenta que em 06 de dezembro, uma equipa do ITRANSMAR visitou o navio e a tripulação, juntamente com um representante do agente, a empresa Portmar, tendo constatado que os cinco estavam há dois meses sem salários, “que o combustível estava prestes a acabar e que somente ligavam o gerador elétrico uma hora por dia para poderem cozinhar”.
“A tripulação não tinha água para beber, somente água para tomar banho e a alimentação que comprava com o seu próprio dinheiro apenas era suficiente para uma refeição por dia. E, em termos de trabalho, a tripulação disse que o navio tinha ido à pesca pela última vez em abril de 2021”, lê-se no documento.
Na mesma ocasião, o agente do navio explicou que o armador pertence à Iceberg Seafood Lda FZC, que formou uma sociedade com Miroslav Oufmtsev, resultando na Bantu Fishing, Lda, participada em 60% pela TEBERG e em 40% por aquele empresário.
O agente acrescentou que o navio chegou ao país ao abrigo de um memorando de entendimento entre o Instituto Oceanográfico de Moçambique e a Bantu Fishing, para “fazer pesquisa de crustáceos de profundidade”, mas “houve desentendimento entre os sócios”, que deixaram de custear as despesas do navio, nomeadamente do agente, porto, tripulação e migração, “o que fez com que o navio ficasse em dívida com estas entidades”, em mais de 430 mil dólares (394,7 mil euros).
Só o agente reclama uma dívida de 30 mil dólares (27,5 mil euros), mas rejeita que seja esse o motivo para não fazer desembarcar a tripulação: “Desembarcando a tripulação, que conhece o navio, o mesmo estaria abandonado no porto, colocando em risco a segurança do navio e do porto”.
A investigação do ITRANSMAR participada ao tribunal concluiu ainda pelo “incumprimento” do memorando, que termina em 23 de fevereiro próximo, por parte da Bantu Fishing, que devia providenciar três embarcações, o que não aconteceu. Também confirmou que o navio tem certificado de navegabilidade e de rádio “expirado” desde maio, e que a licença de pesca do tipo Investigação Científica expirou em 31 dezembro passado.
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