"Há que ter em atenção que não basta que os fins sejam legítimos, que as aspirações sejam legítimas ou justas, é preciso depois que os meios não venham prejudicar os fins, isso obriga a uma ponderação permanente entre aquilo que se quer realizar e satisfazer, e os sacrifícios impostos a outros membros da comunidade", disse Marcelo Rebelo de Sousa.
Referindo-se ao assunto "em abstrato", o chefe de Estado assinalou que "todas as greves impõem sacrifícios, maiores ou menores", e sublinhou que "o problema está na ponderação".
"E é isso que eu penso que uma análise muito lúcida impõe que seja feito sempre", vincou, defendendo precisamente ponderação e equilíbrio.
Falando aos jornalistas antes de dar uma aula na Faculdade de Direito de Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa lembrou a recente viagem que fez de camião, entre o Porto e Lisboa, ocasião em que teve oportunidade de tomar conhecimento de algumas queixas da classe.
Marcelo Rebelo de Sousa sustentou que "o direito à greve é um direito que a Constituição prevê e a lei prevê", mas alertou que "esse direito é um direito que, para ser eficaz, deve utilizar os meios mais adequados para que os fins tenham sucesso".
O Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) e o Sindicato Independente de Motoristas de Mercadorias (SIMM) convocaram uma greve para o dia 12, por tempo indeterminado, e acusaram a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (Antram) de não querer cumprir o acordo assinado em maio, que pôs fim a uma greve que deixou os postos de abastecimento sem combustíveis.
Na ótica do Presidente da República, "aquilo que quem promove lutas laborais deve sempre procurar é o melhor meio para conseguir chegar ao objetivo, e o melhor meio, em muitos casos, até se encontrar esgotado, é o meio do diálogo, o meio da conversa, o meio da mediação ou da manutenção de um processo de tentativa de convergência de pontos de vista".
“Qual é a melhor maneira para realizar certos objetivos? [...] deve ser continuar a negociação, promover a negociação, nomeadamente se há outras entidades sindicais que estão a negociar e a obter algumas vantagens, ou deve ser ir para a greve?”, questionou o chefe de Estado.
Segundo o Presidente, outra das questões que deve ser ponderada e que “importa muito” é “como é que os portugueses veem a greve”.
“Porque uma coisa é uma greve que é vista como dirigida contra os patrões, ou contra os patrões e o Estado, outra coisa é uma greve vista como sendo contra os patrões, o Estado e muitos portugueses”, sublinhou, assinalando que “se isso acontece, se de repente há na sociedade portuguesa um sentimento, uma reação”, se a sociedade se “sentir refém da luta, deixa de se identificar com a luta”.
“E, ao não identificar-se com a luta, aqueles que prosseguem fins em muitos aspetos legítimos e justos, passam a ter contra si, não o patronato e na opinião deles o Estado, mas eu diria a generalidade dos portugueses ou um número muito elevado de portugueses”, avisou, acrescentando que, “a partir desse momento, inverte-se a lógica, os meios começam a comprometer os fins”.
Se isso acontecer, continuou Marcelo Rebelo de Sousa, “aquilo que é um conjunto de ideias que mereciam ser acolhidas, passa a não ter acolhimento por uma reação de muitos portugueses, de um número enorme de portugueses, contra os meios escolhidos, porque acham que o sacrífico é excessivo”.
Esta é uma análise feita “em geral”, mas que “tem presente” a “simpatia” com as “preocupações do setor”, justificou o Presidente da República, notando estar a ser "frio e isento” e que “neste, como noutros casos, é sempre uma pena quando, havendo boas razões a defender, essas razões são perdidas ou comprometidas ou sacrificadas por causa do excesso de meios utilizado".
(Notícia atualizada às 17:50)
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