“Têm todos eles uma craveira intelectual elevada”, afirmou à agência Lusa o arcebispo de Braga, Jorge Ortiga, realçando que possuem “uma compreensão e conhecimento dos problemas internos da Igreja, mas também dos externos”.

Jorge Ortiga considera que se trata de “pessoas preparadas, competentes e com capacidade para serem um contributo positivo do que é característico do Colégio Cardinalício, que é serem conselheiros do Papa”.

A reitora da Universidade Católica Portuguesa (UCP), Isabel Capeloa Gil, salientou que Tolentino Mendonça, o cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, e o bispo de Leiria-Fátima, António Marto, “representam visões do mundo profundamente ancoradas num universo cosmopolita”.

“São figuras intelectuais e respondem àquilo que são as necessidades e evolução do contexto da Igreja”, disse Isabel Capeloa Gil.

Por seu turno, Alfredo Teixeira, antropólogo e especialista em Estudos de Religião, observou que os três “transportam a experiência de investigação e trabalho intelectual favoráveis à valorização do diálogo com a cultura”.

Acrescentando que todos foram docentes e investigadores na Faculdade de Teologia da UCP, Alfredo Teixeira sublinhou que reforçam “uma perspetiva valorizadora da inscrição da Igreja católica nos debates contemporâneos”.

“Por outro lado, apresentam-se próximos da linha reformista do Papa Francisco, alargando, assim, a sua base institucional de apoio”, observou.

Este sábado, na Cidade do Vaticano, Tolentino Mendonça, de 53 anos, convidado pelo Papa Francisco para pregar o retiro da Quaresma da Cúria Romana, em 2018, torna-se no 46.º cardeal português e no sexto deste século. É arquivista e bibliotecário do Vaticano desde setembro de 2018.

Quando foi ordenado bispo, em julho de 2018, Tolentino Mendonça disse que Francisco esperava de si que continuasse “a ser um instrumento de diálogo de aproximação entre a Igreja e a cultura”.

Questionado então se estava disponível para a reforma da Igreja, respondeu: “Certamente é para colocar-me numa grande proximidade com a sua mensagem, com o seu programa para a Igreja do nosso tempo”.

Natural de Machico, Madeira, o futuro cardeal entrou no seminário aos 11 anos. Doutorado em Teologia Bíblica e antigo vice-reitor da UCP, é um nome essencial da poesia portuguesa contemporânea, tendo já recebido vários prémios.

Em fevereiro de 2016, na conferência de abertura do Correntes d’Escritas, na Póvoa de Varzim, disse ter um sonho que é o de um dia ver o silêncio consagrado Património Imaterial da Humanidade.

“Nós declaramos património as grandes construções, o canto, todas as coisas associadas à expressão e esquecemo-nos que o silêncio também é uma forma de expressão extraordinária e que, no silêncio, experimentamos muitas vezes uma comunhão, uma proximidade que nenhuma palavra do mundo é capaz de nos fazer sentir”, afirmou Tolentino Mendonça.

A reitora da UCP destacou que o futuro cardeal “consegue conciliar a veia da reflexão teológica com a sensibilidade artística”, é uma pessoa “de diálogo, de criação de pontes”, declarando-se convicta de que é “uma figura central para abraçar os desafios da Igreja no novo milénio”.

Isabel Capeloa realçou igualmente o percurso do cardeal António Marto, “um académico” de 72 anos, natural de Tronco, Chaves.

António Marto foi aluno de Bento XVI (papa emérito), que acolheu em 2010 no Santuário de Fátima, onde também recebeu o Papa Francisco, em 2017. O seu interesse pela vida eclesial despertou cedo e aos 10 anos entrou no seminário.

Fez o doutoramento em Teologia em Roma, foi bispo auxiliar de Braga de 2001 a 2004 e passou por Viseu antes de entrar na Diocese de Leiria-Fátima, em junho de 2006.

Quando foi conhecida a sua nomeação como cardeal, em maio de 2018, assumiu estar envolvido na reforma da Igreja - que considerou ser necessária e para levar para a frente –, “para que seja mais evangélica” e que “estende pontes para todos os lados e não vive fechada em si”.

Vice-presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) e membro do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, de António Marto destacam-se, entre outras, as suas posições em defesa da vida ou críticas ao poder.

Quando a crise atingia o país, em 2011, defendeu que Portugal precisava de uma nova cultura política que afastasse os privilégios partidários e sustentou que “uma economia e uma finança sem ética pode levar à catástrofe e à ruína de um país”.

A nível externo, nunca cessou os apelos para a paz em várias regiões do mundo e pedidos para uma intervenção internacional face ao drama dos refugiados.

Ao contrário de António Marto, o cardeal-patriarca de Lisboa apenas entrou no seminário aos 24 anos, embora tenha mostrado interesse pela vida clerical aos 13.

Natural de Torres Vedras, Manuel Clemente, 71 anos, é doutorado em Teologia Histórica, foi bispo do Porto e depois patriarca de Lisboa.

Em 2009, conquistou o Prémio Pessoa, tendo o júri realçado que a intervenção cívica de Manuel Clemente “tem-se destacado por uma postura humanística de defesa do diálogo e da tolerância, de combate à exclusão e da intervenção social da Igreja”.

Criado cardeal em fevereiro de 2015, é também presidente da CEP e membro da Congregação para o Clero.

Quando foi conhecida a sua nomeação cardinalícia, afirmou à Rádio Renascença que seria um gosto colaborar ainda mais diretamente com o Papa, referindo identificar-se “absolutamente” com o pontificado e pensamento de Francisco, e reiterou o seu compromisso perante os desafios colocados por este, com especial atenção aos mais pobres e às periferias.

A reitora da UCP referiu que Manuel Clemente, magno chanceler da universidade, é um “dos maiores historiadores do país” e “um dos maiores pensadores sobre a transformação da identidade portuguesa”.

Além destes três cardeais eleitores, Portugal está representado no Colégio Cardinalício por Monteiro de Castro e Saraiva Martins que, por terem mais de 80 anos, não participam num futuro conclave para eleger o sucessor de Francisco.

Monteiro de Castro é natural de Santa Eufémia de Prazins, Guimarães, onde nasceu há 81 anos. Foi penitenciário-mor da Santa Sé e somou uma vasta experiência diplomática ao serviço do Vaticano. Foi criado cardeal por Bento XVI,

Saraiva Martins, de 87 anos, é natural de Gagos do Jarmelo, Guarda. Em 1988 foi nomeado secretário da Congregação para a Educação Católica e, 10 anos depois, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Foi criado cardeal por João Paulo II (1920-2005), no mesmo dia do ex-cardeal-patriarca de Lisboa José Policarpo (1936-2014).