O recluso em causa, Ezequiel Costa Ribeiro, de 56 anos, foi detido quando tinha apenas 19 e condenado, na altura, a uma pena que não ultrapassava os 20 anos. “Mas ainda hoje continua preso, quando a pena de prisão em Portugal, por lei, não pode ir além dos 25 anos”, explica o responsável da OVAR, instituição da Igreja Católica de apoio aos reclusos e seus familiares.
Mas porque continua Ezequiel detido? “A justificação que dão é que ele tem esquizofrenia paranóide e que por isso tem de continuar sujeito a medidas de segurança, mas a verdade é que há muitas pessoas com a mesma doença em liberdade, ou que estão internadas em hospitais civis”, refere ao 7MARGENS Manuel Almeida dos Santos, acrescentando que “o Ezequiel está naquilo que eufemisticamente é chamado de clínica psiquiátrica do estabelecimento prisional, o que na prática é na mesma a prisão”.
De resto, o responsável da OVAR, que conhece e visita Ezequiel praticamente todas as semanas há já 15 anos, foi impedido de o fazer no passado sábado. “Não me deixaram visitá-lo, porque foi colocado na cela de isolamento, e também não autorizaram a visita do capelão prisional, o que é uma violação da Concordata [entre a República Portuguesa e a Santa Sé], já que esta diz que a Igreja tem direito a exercer a sua atividade religiosa em todo o território e não há nenhuma ressalva”, alerta.
Além de protestar contra o prolongamento indefinido do seu tempo de reclusão, Ezequiel Costa Ribeiro queixa-se também do tratamento clínico a que tem sido sujeito no estabelecimento prisional. “A medicação que lhe dão, com psicotrópicos fortes, está a causar-lhe perturbações físicas e psíquicas, mas a médica psiquiatra que o acompanha na prisão insiste em não fazer alterações”, explica o presidente da OVAR, referindo que outro psiquiatra fora do estabelecimento prisional é da opinião de que aquela não é, de facto, a medicação mais adequada a Ezequiel. “Também já pedimos muitas vezes que ele fosse avaliado por um psiquiatra externo e recusaram sempre”, acrescenta.
“Não há transparência das autoridades portuguesas”
Apesar dos problemas de saúde, “todos os sábados, era o Ezequiel que preparava o espaço para a celebração da missa na prisão, escolhia os cânticos, organizava o coro e lia a primeira leitura”, assinala Manuel Almeida dos Santos.
O responsável da OVAR sabe, no entanto, que, nos relatórios periódicos apresentados pelos técnicos do estabelecimento prisional tendo em vista a reavaliação da situação, é referido “que ele não manifesta vontade de participar em qualquer atividade na prisão”. “Eu sou testemunha de que isso não é verdade”, assegura. “O que acontece é que, por um lado, as atividades de natureza espiritual e religiosa não são valorizadas pelos técnicos e, por outro, o Ezequiel pediu várias vezes para participar em outras atividades e não permitiram, alegando que no estado psiquiátrico dele não é aconselhável.”
Esta não é a primeira vez que Ezequiel Costa Ribeiro manifesta o seu descontentamento face ao prolongamento indefinido da sua reclusão, tendo no ano passado feito queixa ao Comité Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT), que na sequência disso visitou o Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo para avaliar a situação em que se encontrava. O relatório dessa visita “já está na posse do Governo português, que no entanto não o divulga”, lamenta Manuel Almeida dos Santos. “Sei que a equipa do Comité conversou com o Ezequiel e isso consta certamente do relatório, mas infelizmente não há transparência das autoridades portuguesas, e esta cultura de opacidade é incompatível com aquilo que se diz que é um país democrático.”
O responsável da OVAR soube esta quinta-feira de fontes do estabelecimento prisional que Ezequiel terá sido transferido nas últimas horas de Santa Cruz do Bispo para o Hospital Prisional de São João de Deus, em Caxias, mas desconhece os motivos que levaram à transferência. O 7MARGENS contactou o Ministério da Justiça na passada terça-feira, 9 de maio, para obter esclarecimentos sobre o caso, mas até às 15 horas desta quinta-feira não obteve qualquer resposta.
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