José Antunes Calçada, que se demitiu em protesto pela exoneração de cinco comandantes de unidades do Exército dias após o furto, foi ouvido durante três horas na comissão de inquérito ao caso de Tancos, no parlamento, e explicou que pediu para passar à reserva por que o ex-CEME general Rovisco Duarte não o exonerou, a seu pedido.
“Passei à reserva porque não me exoneraram”, explicou Antunes Calçada, que relatou, durante a audição, uma conversa com o ex-CEME dias após o furto, em que admitiu, em resposta ao deputado do PCP Jorge Machado: “A responsabilidade é toda nossa”.
“Se na averiguação [aos acontecimentos de junho de 2017] houvesse responsabilidade objetiva da cadeia de comando, no fim dessas conclusões, como eu julgo que vieram a concluir algumas, nós devíamos demitir-nos”, disse.
Embora isso pudesse significar “uma decapitação do generalato”, questionou o deputado do PS Jorge Gomes.
A resposta foi afirmativa: “Às vezes tem de ser… Quando é para por as coisas na ordem”.
Para o general, os oficiais generais do Exército, em que estava incluído, deveriam “levar tudo até ao fim e assumir, como instituição e como indivíduos, as responsabilidades”.
O antigo comandante do Pessoal e o general Faria Meneses, ex-comandante das Forças Terrestres, já ouvido na comissão, foram os únicos a demitir-se na sequência do furto de Tancos, em 2017, depois de Rovisco Duarte ter demitido os cinco comandantes das unidades com responsabilidades de nomear o contingente de militares que fazia a seguranças aos paióis.
Para Antunes Calçada, a exoneração dos cinco comandantes foi uma quebra de confiança e um “atestado de putativa irresponsabilidade”, após Rovisco Duarte ter alegado que os afastava por causa do processo de averiguações em curso na altura.
“Não posso estar sob o comando de um general que faz isto a cinco comandantes”, insistiu.
Durante a audição, Antunes Calçada afirmou, que num primeiro momento, o então CEME e os generais do Exército, numa reunião informal, no dia em que foi conhecido o furto, 29 de junho de 2017, adotaram uma estratégia que, dias mais tarde, garantiu, foi alterada por Rovisco Duarte.
A resposta passaria por fazer um processo de averiguações, pedir uma investigação pela Inspeção-Geral do Exército, a reparação imediata das vedações dos paióis e permitir que os militares que faziam a segurança aos paióis retirassem os selos aos carregadores das suas armas, enumerou.
Passados três dias, em 1 de julho de 2017, o ex-CEME disse, numa entrevista à RTP, que ia exonerar os cinco comandantes, o que precipitou a saída de Faria Meneses e de Antunes Calçada.
Por várias vezes foi questionado, por Telmo Correia (CDS), por exemplo, se teriam existido pressões políticas para esta mudança de estratégia.
Uma e outra vez, o antigo comandante do Pessoal do Exército disse que poderia ter “suspeitas ou perceções”, mas, dado que não tinha provas, nunca respondeu diretamente à questão.
“Se foi por pressão do senhor ministro [da Defesa] é grave, mas se foi por iniciativa do CEME também é grave. É grave e imperdoável. Para os senhores pode ser importante, para mim não foi” para decidir o pedido de passagem à reforma, declarou.
O caso do furto de armas em Tancos ganhou importantes desenvolvimentos em 2018, tendo sido detidos, numa operação do Ministério Público e da Polícia Judiciária, sete militares da Polícia Judiciária Militar e da GNR, suspeitos de terem forjado a recuperação do material em conivência com o presumível autor do crime.
Primeiro o general Rovisco Duarte e depois o ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes, demitiram-se dos cargos.
A comissão de inquérito para apurar as responsabilidades políticas no furto de material militar em Tancos tem previstas audições a mais de 60 personalidades e entidades, vai decorrer até maio de 2019 e é prorrogável por mais 90 dias.
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