“Hoje joga o Mengão por isso não tem confusão!”, podia ouvir-se nas Docas de Lisboa a pouco mais de uma hora do começo da final da Taça Libertadores. A verdade é que um olhar rápido pelas esplanadas desmentia por completo o cântico dos mais de mil adeptos que se juntaram na Embaixada Fla Portugal para ver a segunda final da Taça Libertadores em que os ‘rubro negros’ participavam, a primeira com um português ao comando, Jorge Jesus.
Trinta e oito anos depois, o Flamengo alcançou o bilhete para o jogo mais apaixonante da América do Sul e entre bandeiras, cachecóis e muita cerveja nenhum adepto do Fla pensava noutra coisa que não a vitória da equipa carioca.
Marcos, de 46 anos, não se lembra da final de 1981, quando tinha apenas oito anos, por isso encarou esta, em Lima, como a sua primeira.
“É uma emoção única e por isso trouxe a família toda e tenho esperança que dê tudo certo”, diz confiante o brasileiro que este ano se mudou para Portugal.
Antevendo um jogo “duro”, Marcos coloca todas as fichas na capacidade de Jorge Jesus em encontrar a melhor forma de colocar o Flamengo no topo de novo.
“Jorge Jesus é um dos segredos deste Flamengo e o trabalho que ele está a fazer é excecional. O que o Flamengo joga hoje é completamente diferente do que fazia no início do ano. É sensacional”, elogia.
Poucos metros à frente, equipados a rigor, de vermelho e preto, Carolina, Rafael e Filipe têm a mesma opinião: Jesus, o mister, é o arquiteto deste rejuvenescimento do Flamengo depois de um começo de época “difícil”.
“Foi ele que colocou a equipa a jogar para a frente”, sublinha Rafael, que a poucos minutos do apito inicial só tinha uma certeza: “O Flamengo vai ganhar e eu vou passar uma hora a chorar. Foi a vida toda à espera disto e o Flamengo vai estar no lugar que merece”, vaticina.
A bola começa a rolar e a euforia que antes se sentia no ar começa a esmorecer logo após os primeiros minutos de jogo. O River Plate entra forte e impõe a sua lei, empurrando a equipa do Rio de Janeiro para a sua defesa. Aos 15, Rafael Santos Borré confirma a suspeita das centenas de adeptos presentes nas Docas e coloca a equipa argentina na frente do marcador.
Depois de uma primeira parte “frouxa”, George Mendes, 66 anos, acredita que o Flamengo pode dar a volta, mas pede mais a Jesus.
“O River foi muito melhor, está mais seguro. O Jorge Jesus tem de atuar agora se quer ganhar, e eu acredito em Jesus”, diz apontando para o céu.
Flávio aproveita o intervalo para respirar ar puro. Vai até à varanda, olha a multidão ‘rubro negra’, e triste confirma o que todos viram, mas querem rapidamente esquecer.
“Esta primeira parte foi muito má. O Flamengo jogou pouco, parece que está com medo da pancada dos argentinos”, comenta o brasileiro, que ainda assim não perde a esperança. “Vamos dar a volta e acabar a ganhar por 2-1”, atira.
A segunda parte começa, o Flamengo melhora, mas mesmo assim parece curto perante um River Plate mais coeso e sempre a explorar o contra-ataque. Aos 57, a primeira grande oportunidade do Flamengo no jogo, com Gabriel Barbosa e Everton incapazes de fazer o golo quando em Lisboa já todos o festejavam.
O relógio corria rápido demais e até Flávio, que vaticinara o 2-1 ao intervalo, parecia já descrente em tal façanha. Mas Gabigol tinha outros planos: o avançado, que passou pelo Benfica de forma discreta, assinou o empate aos 89 minutos e aos 90+2 fez explodir a festa dos flamenguistas. Dois golos em três minutos e o Flamengo punha as duas mãos na segunda Taça Libertadores da sua história.
Depois de um ano em que perdeu tudo em Portugal no fatídico minuto 92, Jorge Jesus conquistava o seu primeiro troféu internacional com o relógio caprichosamente a assinalar a mesma cifra. E foi nome dele que os adeptos nas Docas gritaram de imediato mal o árbitro confirmou o final do jogo.
“Olé, olé, olé… mister, mister”, foi o primeiro cântico que se ouviu e Jesus tornava-se naquele momento o maior herói da multidão.
“Jesus é o obreiro deste título. Foi escorraçado pelos portugueses, mas mostrou que é o melhor do mundo”, diz eufórico Alfredo, gritando bem alto para toda a gente ouvir: “Meu Mengão é o campeão!”
Aos 46 anos, Fernando tinha apenas uma memória ténue da conquista de 81. Hoje tornou essa memória bem mais presente e agradece a Jesus por isso.
“O mister organizou a casa e esse é o segredo. Temos uma equipa muito ajeitadinha e para isso é preciso que alguém organize e mude a mentalidade. O mister é um craque e queremos que ele continue connosco”, diz já de olhos postos no Mundial de Clubes.
“Vou já comprar bilhetes para o Qatar, ou seja, lá onde for. Era para estar em Lima, mas decidi vir para Lisboa… mas nessa altura não tem jeito, quero lá estar para assistir ao meu Flamengo ser campeão do mundo”, antecipa.
A vitória do Flamengo apareceu depois de 38 anos de uma longa espera, por isso a festa não tem horas para acabar. O samba saiu à rua e Gerson define o tom das próximas horas: “Festa e mais festa, porque vitória do Flamengo é melhor do que o final do mês”, grita eufórico.
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