As ruas do Montijo estão desertas. A excepção é uma ou outra mala de viagem que se encaixa no porta-bagagens do TVDE parado no meio da faixa de rodagem, com os 4 piscas a sinalizar a frustração de não realizar a principal função para que está destinado, que, como sabemos, é empatar o trânsito, o qual é inexistente a esta hora. E, claro, a população que se convencionou chamar migrante, invisível para a maioria. A vasta maioria que vejo são ucranianos, nepaleses, cabo-verdianos, angolanos, brasileiros, romenos e tantas outras etnias e nacionalidades. Pessoas exactamente como nós, mas que todas as manhãs lutam heroicamente contra o sono e o cansaço. Enfrentam mais um dia de labuta para ajudarem a construir um país que não é o seu, mas que escolheram para passar a ser. Chegaram até nós das mais variadas formas, fugindo duma morte certa ou dum futuro incerto. Pintam, edificam, escavam, plantam, varrem, cozinham. Constroem as casas que tornamos lares; limpam os escritórios onde trabalhamos; confecionam as refeições que avidamente consumimos… Fazem o trabalho que não queremos. Dão tudo e pedem pouco em troca.

Por este concelho há alguém que quer forçar uma agenda de ódio sobre esta população, que historicamente, nos diversos fluxos migratórios existentes, internos ou externos, sempre foi bem recebida e incluída. Tenta traçar uma relação entre criminalidade e migração, facto que carece de qualquer fundamento. Inventa acontecimentos que nunca sucederam. Deixa no ar insinuações que não materializa. Instrumentaliza situações de forma intelectualmente desonesta. Projecta nos migrantes todas as razões de insegurança no território. Um compêndio doutrinal que só existe na sua cabeça, mas que viraliza entre os espíritos mais incautos e entre as classes mais desfavorecidas. O objectivo é colher votos autárquicos, com aquilo que parece ser uma tendência social que vai marcando a agenda e conquistando espaço mediático.

Quando o poder político não dá resposta para as questões mais prementes e que influenciam negativamente a vida das pessoas, surgem como cogumelos os discursos populistas. Encontram terreno fértil. É fácil convencer os descontentes de que a culpa é do estrangeiro, que é ele que te tira tudo e que ficaremos melhor orgulhosamente sós. A definhar… Cabe a todos nós que estamos nos antípodas deste discurso, que temos uma visão progressista, conglomeradora, pacificadora e cosmopolita da sociedade fazer a pedagogia junto dos nossos e esclarecer que a realidade é muito mais rica do que o preto e branco que nos tentam impingir. É composta por uma paleta de cores infindável que contrasta de forma berrante com a dicotomia cromática. 

Por outro lado, precisamos de forçar a acção política. São urgentes soluções para a habitação, saúde, dignificação laboral, ambiente, higiene urbana. Cada um de nós, à nossa escala, deveremos participar civicamente e pressionar o poder político, incitando-o para a acção e para desenhar respostas que confrontem as problemáticas. Sendo que é essencial que o poder político seja mais transparente e inclusivo. Só com mais democracia e participação poderemos derrotar o discurso obscurantista, mais escuro do que as cinco de todas as manhãs…