Durante o dia, um campo de 20.000 metros quadrados de alho-francês, em Lelystad, na Holanda, é igual a qualquer outro, mas, à medida que o sol se põe, a luz azul e vermelha, misturada com radiação ultravioleta (UV) invisível, transforma o campo numa paisagem multicolor.
Segundo conta o The Guardian, o que pode parecer apenas um espetáculo de luz LED, não serve apenas um “efeito visual” e combina mesmo arte e ciência. Durante um par de horas, todas as noites, a instalação ilumina o campo numa tentativa de fazer com que o alho-francês cresça melhor e conta com quatro unidades alimentadas por energia solar que emitem um espectro feito à medida.
Esta instalação, Grow, resulta de dois anos de colaboração entre o artista e designer holandês Daan Roosegaarde e biólogos botânicos e ajuda as culturas a crescerem melhor, prolongando eficazmente as horas de luz solar. Durante décadas, a luz vermelha e azul tem sido utilizada em estufas e, mais recentemente, em operações agrícolas verticais para melhorar o crescimento das plantas e maximizar os rendimentos. Agora, está a ser aplicada também a culturas que crescem no exterior.
Jason Wargent – fotobiólogo de plantas e diretor científico e fundador da empresa BioLumic, sediada na Nova Zelândia –, que trabalha com Roosegaarde para pré-programar as plantas utilizando luz, refere que esta “atua como um sinal informativo”.
Assim, segundo explica, ao fornecer combinações de tipos específicos de UV às sementes ou plântulas, há mecanismos internos que podem ser desencadeados para aumentar a produtividade numa fase posterior, ao mesmo tempo que aumentam a capacidade das plantas de se protegerem contra pragas e doenças.
Perante uma previsão de população global estimada em 9 mil milhões de pessoas para alimentar até 2050, de acordo com a ONU, intensifica-se a pressão para aumentar a produtividade agrícola, mas muitos pesticidas e fertilizantes podem resultar em poluição uma vez libertados no solo e cursos de água e, para Wargent, as "receitas de luz" poderiam ser "a próxima grande revolução na agricultura".
"Os agricultores precisam agora de um conjunto diversificado de ferramentas para aumentar os rendimentos. Esta alternativa limpa poderia ajudar a reduzir a necessidade de produtos químicos agrícolas que, por sua vez, são dispendiosos e morosos de desenvolver, e podem poluir o ambiente uma vez aplicados", diz Wargent.
"Estamos a desbloquear a capacidade da planta para fazer coisas, florescer e crescer, com uma receita de luz programável, mas sem a penalização".
No laboratório BioLumic, os tratamentos UV são aplicados logo no início da vida de uma planta e podem ser aplicados durante sete dias numa plântula ou apenas alguns minutos no caso de uma semente, mas, uma vez expostos a essa explosão de radiação, os efeitos durarão a vida útil da planta, segundo Wargent.
Nos campos de alho-francês em Lelystad, o desenho de iluminação de precisão direciona os feixes horizontalmente através do campo. Segundo Roosegaarde, que apoia o Dark Sky Movement, o qual visa reduzir a poluição luminosa a nível global, nada se eleva e a exposição é localizada durante pouco tempo todas as noites, de modo a não perturbar a vida selvagem.
Roosegaarde espera realizar uma digressão por 40 países, na qual pretende recriar a sua obra de arte — assim que a covid o permitir. "Desde os campos de arroz na China até aos campos de trigo nos EUA, podemos criar uma receita para se adequar à produção alimentar local e criar uma experiência que reconecte as pessoas com a origem dos seus alimentos", afirma.
Grow é assim a mais recente de uma série de obras de Roosegaarde que abordam problemas ambientais, incluindo uma autoestrada inteligente que carrega durante todo o dia e brilha à noite, e uma instalação de arte que permite aos visitantes interagir com algas emissoras de luz. O seu estúdio está atualmente a trabalhar num projeto chamado Urban Sun, que visa "limpar o coronavírus em espaços públicos".
"Há tanta ciência e tecnologia, mas está escondida", diz Roosegaarde. "O meu trabalho é ativá-la e iluminá-la".
Comentários