Parece mentira, mas não é: esta quarta feira, no espaço PlayOne, deu-se a estreia do primeiro palco dedicado somente aos vídeojogos em todas as edições da Web Summit. E para explicar os trâmites do gaming às hostes da maior cimeira europeia de tecnologia e empreendedorismo, nada como demonstrar o crescimento de uma indústria que se está a tornar cada vez mais mainstream e a largar aos poucos a conotação de “nicho”. É que está aí e está a crescer — e bem.
Para a maioria dos presentes, assim como para quase todos aqueles que partilham o bichinho pelo mundo do jogos, o início da conferência “eSports: um fenómeno do séc.XII”, viu na contextualização histórica inicial de Ralf Reichert, um dos fundadores da Electronic Sports League (ESL), um momento de nostalgia. Quer pelas imagens exibidas, quer pelas aventuras que recordou e partilhou. Afinal, quem nunca se juntou com o grupo de amigos para fazer umas partidas de FIFA, Counter-Strike, entre tantos exemplos? Muitos o fizemos, "só" não o fizemos quase à escala global. Ficámos, por assim dizer, pela cave ou quarto da nossa casa.
Reichert recordou então que a primeira vez que o seu grupo de amigos se reuniu foi em 1981, para ver quem conseguia atingir a pontuação máxima de Space Invaders (está a ver o Pac-Man? Pronto, agora imagine que em vez de estar num labirinto a fugir de fantasmas, se encontra no fundo do ecrã a disparar através de um canhão de uma nave espacial contra aliens). De acordo com fundador da ESL, este terá sido o primeiro torneio de eSports. Porém, ainda que assim fosse, considera que o “verdadeiro nascimento da indústria” só aconteceu mais tarde, em 1996, com o lançamento do jogo Quake.
Em 2017, o panorama cresceu e evoluiu. Vinte anos volvidos, é um produto que enche arenas em torno de duas equipas a tentar sair por cima num jogo de computador. Um evento ao vivo de eSports pode atrair cerca de 40.000 pessoas, às quais se juntam umas dezenas de milhares via Internet. Longe vão os tempos em que os eSports estavam confinados a garagens e quartos. E Reichert garante que as emoções nas bancadas e jogadores são iguais àquelas dos atletas dentro de um campo de futebol.
Sobre o eSports, a ESPN escreveu que “pela primeira vez em várias gerações estamos a testemunhar o nascimento de um novo desporto. Todas as ligas desportivas estão desesperadas para se tornar como a do Gaming: nova, global e incrivelmente diversa”.
Segundo dados apresentados durante esta manhã, o eSports é uma porta aberta para chegar até à geração digital. Ora veja: 81% da sua audiência tem entre 18-34 anos. Ou seja, fazem quase todos parte dos tão desejados millennials. No entanto, atinge maioritariamente o segmento masculino, cerca de 70%. Quanto aos salários dos profissionais? Altos. Ganham bem acima da média dos que vivem do mundo online. Entusiastas? É estimado que sejam mais do que aqueles que a NFL dispõe.
Mas será que as pessoas veem mesmo isto como desporto? A resposta é sim. Em 2013, torneio do jogo League of Legends (LoL) esgotou Staples Center, em Los Angeles, nos Estados Unidos. Depois, esgotou o estádio nacional de Seul (sim, o estádio de futebol com capacidade para 40.000 mil pessoas), enquanto 27 milhões acompanharam o evento online.
Quanto vale a indústria?
Globalmente, em 2016, a indústria dos eSports valeu uma receita de 892,8 milhões de dólares (763 milhões de euros), segundo dados da SuperData, empresa dedicada ao estudo deste mercado. Este número é “resultado de mais marcas e anunciantes a entrar no mercado”, explica o relatório.
Os entusiastas por eSports gastaram, no ano passado, 231 milhões de dólares (197 milhões de euros) em bilhetes, merchandising e contribuições para os prémios, um crescimento de 36% face ao ano anterior. Este consumo direto representa um quarto das receitas dos eSports. As audiências “são predominantemente masculinas (85%), com quase metade a ter entre os 18 e os 25 anos (45%). No ano passado foram mais de 213 milhões de pessoas e deverão crescer, até 2019, para os 303 milhões. A Ásia lidera atualmente o mercado dos eSports, seguindo-se a América do Norte e a Europa.
Portugal também não foge à febre da indústria que poderá valer 1,1 mil milhões de dólares em 2019 (940 milhões de euros). Ainda recentemente, em julho, o grupo YoungNetwork Group decidiu investir na área para dinamizar o mercado do eSports no nosso país.
É tudo? Não. Porque apesar de todo este crescimento em termos de audiência, o seu valor em termos de monetização é francamente inferior ao arrecadado nos desportos tradicionais. Isto é, ainda que esteja a atrair mais entusiastas para a sua cadeia de seguidores, comparativamente com o NFL ou NBA, os espetadores de eSports gastam muito pouco. Em média, de acordo com aquilo que foi partilhado por Reichert, gastam cerca de 3 euros em merchandise [produtos oficiais] e afins; ora, no caso do futebol norte-americano e no basquetebol, esse valor sobe, respetivamente, para os 50€ e 30€.
A hierarquia
Reichert deixou bem claro: o eSports é massificado, mas tudo funciona de acordo com uma estratificação em pirâmide, definida por vários parâmetros. O jogo poderá “não o ser melhor”, mas se é o mais jogado/visto online, tem poder soberano sobre os demais. Em suma, é fazer a equação: utilizadores ativos + espetadores = a salários mais altos.
Na primeira linha da ESL estão jogos como o LOL, Dota 2, Heart Stone e Counter Strike; na segunda, a um nível intermédio, temos Call of Duty, Overwatch, Starcraft, Halo e World of Tanks; finalmente, na terceira, Rocket League, Vain Glory e FIFA 17.
Por último, colocou-se a questão: poderá o eSports integrar os Jogos Olímpicos? "Não é uma questão do 'se'. É saber quando", revelou Reichert. No entanto, para já, fica só uma certeza, anunciada a 2 de novembro: o eSports é convidado especial dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018, na Coreia do Sul.
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