The Bear é uma das séries do momento e não é razão para menos. Christopher Storer, o criador e realizador de grande parte dos episódios, mergulhou na cozinha e no mundo dos Chefs para habilmente explorar temas como o luto, a morte e a família. E sendo uma história do dia-a-dia daqueles que fazem um restaurante ganhar vida, especialmente agora que estamos órfãos de Better Call Saul ou Succession, é seguro dizer que dificilmente encontramos melhor opção no menu da televisão do que este.

Não só porque vimos relações a florescer e personagens a embarcar em jornadas emocionais profundas, mas também porque do ponto de vista técnico é praticamente irrepreensível e a série tem um estilo que hoje associamos imediatamente a The Bear. A qualidade da escrita e dos atores, o guião imaculado que subtilmente mete várias pessoas a entrar numa cena como se dança de ballet coreografada se tratasse, a edição frenética com planos longos e cortes rápidos que enchem o ecrã e os nossos corações de ansiedade, a cinematografia de Andrew Wehde que é ao mesmo tempo uma masterclass de “Como Criar O Caos Visual” e uma aula para conseguir imagens de fazer cair o queixo.

Tudo somado, estamos perante algo distintivamente diferente de tudo o resto. E esta semana em particular, a série voltou à ribalta por três razões:

  • Os 10 episódios da terceira temporada ficaram todos disponíveis no Disney+ em Portugal;
  • The Bear bateu o recorde de nomeações (com 23) da série “30 Rock” (tinha 22) na categoria de Comédia nos Emmys;
  • Este recorde reacendeu o debate se devia ou não de estar a competir na categoria de Comédia. Porque tal como analisa o The Guardian esta sexta-feira, The Bear tem humor, mas está longe de ser uma comédia.

Quanto à terceira temporada, esta coloca-nos imediatamente onde a anterior nos deixou. Não há saltos temporais, nem novos acontecimentos a relatar. Esta simplesmente começa onde a outra acaba. O Chef Carmen Berzatto (Jeremy Allen White), também conhecido por Carmy, saiu da arca frigorífica em que ficou preso no final da segunda temporada e o Original Beef of Chicagoland é agora um restaurante requintado e passou a chamar-se “The Bear”. O objetivo de Carmy não podia ser mais ambicioso: uma estrela Michelin. Para lá chegar, o foco tem de ser total. E nada mais importa.

Sobre os novos episódios, o consenso geral dos críticos norte-americanos é o de que a série continua a ser uma das melhores da televisão, mas o menu servido tem um sabor diferente e a temporada fica um pouco aquém das anteriores. Uma das razões para isso, e que alegam que muitos fãs vão dar logo conta, é o ritmo mais vagaroso com que tudo se passa.

O crítico da The Hollywood Reporter explica-o bem: “A indecisão pode ser excitante e achei emocionantes os riscos que 'The Bear' corre nestes 10 episódios. Mas se esperam ver as coisas progredir a um ritmo alucinante, esta é uma temporada que reflete o limbo em que as personagens se encontram.” A Rolling Stone ajuda a concluir o raciocínio: “No seu melhor, 'The Bear' continua a ser inovadora, excelente e tão vívida que é deliciosa de ver. Mas a temporada também parece confusa, exagerada e em alguns momentos inconsistente.”

Ou seja, é preciso saber ler o que se está a querer dizer. Para quem gosta e ainda não viu, não haja receio: a série continua a ser do melhor que há. Está é diferente e há quem considere que esse diferente não é tão bom como aquilo que nos serviram até agora. O que não é fácil de fazer quando num ano há no menu “Peixes” (Episódio 6, que um crítico refere e bem tratar-se de “uma descida de 66 minutos às profundezas do inferno das férias em família”) e “Garfos” (Episódio 7, para muitos um dos melhores episódios de televisão dos últimos anos) e no outro não.

No entanto, fazendo de advogado do diabo, pode-se argumentar que o ritmo mais “lento” até pode vir a ser melhor na opinião de algumas pessoas, que se sentem incomodas com a rapidez da série, mas que até gostam de ver o rodopio da cozinha e o embelezamento dos empratamentos. Mais: como se disse, realmente não há garfos e peixes, mas há os episódios centrados em Tina (Liza Colón-Zayas) e Natalie ‘Sugar’ Berzatto. São ambos excelentes e o primeiro tem a curiosidade de ditar a estreia da atriz Ayo Edebiri (a Sydney na série) na realização, que tem recebido rasgados elogios.

E, depois, claro, há o Episódio-Montagem que abre a temporada e que nos mostra todo o percurso de Carmy até hoje. É um episódio que pode dividir a audiência, uma vez que pode cair na caixa do “experimental”. Há pouco diálogo, pode ser confuso, a montagem anda constantemente para trás e para frente no tempo. Mas é um episódio muito importante porque nos mostra o passado de Carmy e é através deste passado que percebermos porque é que faz o que faz e é como é. Mostra-nos as suas inseguranças, a sua disciplina, o seu talento, a sua dedicação, o seu foco, o seu rigor. É tudo exposto a nu à boleia da belíssima faixa "Together" dos Nine Inch Nails, que está em loop durante 30 minutos. Por outras palavras, é um Episódio-Experiência que nos é servido de bandeja e que tem de ser consumido de mente aberta. Porque quem o fizer vai esquecer-se de que está a ver televisão e vai deixar-se levar pela imersão que é a vida de Carmy.

Além disso, há que ter em conta que o argumento “não é tão boa como as anteriores” pode ser propositado porque as temporadas três e quatro foram rodadas em simultâneo e há um “To be Continued” no final desta que estreou. Portanto, estes novos episódios podem ser ser a calma antes de cair a tempestade.