Pela primeira vez desde o início da guerra, em fevereiro de 2022, os modelos desfilam, desde o passado domingo, as criações de alguns dos designers mais conhecidos no país.

Num momento marcado pela emoção, o primeiro desfile, dos quatros dias do evento, ficou marcado pelo momento de silêncio em homenagem aos militares ucranianos que morreram na frente de combate. Segundo descreve o The Guardian, este ritual tem-se repetido todos os dias, mesmo antes das luzes baixarem, a música aumentar e o desfile começar.

Desde o seu lançamento, em 1997, que a Semana da Moda ucraniana é semestral. Este ano, numa edição há muito aguardada, o local escolhido foi um centro de exposições no coração da capital, enquanto outros eventos associados acontecem em locais diferentes da cidade.

Na passada segunda-feira, o designer Ivan Frolov, referiu à publicação que o local eleito era, inclusive, um do mais visitados e conhecidos pelos ucranianos antes da guerra, abrigando um bar de música eletrónica, que hoje se mantém fechado.

Pelo contrário, algumas casas de ópera e teatros continuam abertos desde as primeiras da invasão, bem como restaurantes e bares, até mesmo junto às praias, na ânsia de os ucranianos continuarem a viver o seu dia-a-dia.

“Durante a segunda guerra mundial, a indústria da moda funcionou em Londres, as pessoas vestiam-se e iam a restaurantes. Todos deveriam entender que a vida aqui ainda continua também”, disse Ruslan Baginskiy, um designer de chapéus da cidade ocidental de Lviv, que ganhou fama internacional, nos últimos anos, ao trabalhar com Beyoncé, Madonna e outras estrelas mundiais.

Questionado sobre se a sua produção tinha sido afetada pelo recrutamento de homens para o exército, Baginskiy explicou: “Claro que sim. A guerra afetou todos. O meu próprio meio-irmão foi morto na linha da frente”.

Iryna Danylevska, a diretora-executiva da Semana da Moda ucraniana, destacou que a moda durante a guerra não é apenas um "escape". Aliás, muitos designers procuraram fazer referência às circunstâncias em que o país se encontra.

“No início, todos nós tínhamos uma euforia e acreditávamos numa vitória rápida, pensando que a guerra terminaria em breve. Mas agora aprendemos a viver com ela”, disse.

Um dos designers, Kostiantyn Omelia, criou uma coleção inspirada nas flores secas que viu quando voltou ao seu estúdio em Kiev, em maio de 2022, após estar ausente do local nos primeiros três meses da guerra. Já Ksenia Schnaider criou um casaco feito de gravatas vintage: a ideia é transmitir que, atualmente, poucos homens ucranianos têm tempo para gravatas, já que o que mais utilizam é o uniforme militar e as roupas casuais.

De acordo com a diretora, Danylevska, um dos objetivos em realizar o evento é ajudar a promover o design e a criatividade ucranianos globalmente. A invasão russa acelerou o despertar cultural na Ucrânia, onde muitos artistas, de todos os setores criativos, procuram agora inspirar-se na história e no folclore que antes eram negligenciados.

Maria Gavrilyuk, fundadora de uma das marcas baseada no tradicional, Gunia, conta que a sua empresa cresceu muito desde 2022: “Antigamente, quando eu viajava e dizia que éramos da Ucrânia, ninguém sabia nada sobre o país. Agora é que o mundo está a entender que temos uma cultura rica e muitas técnicas únicas".

"É uma pena que tenham sido necessárias estas circunstâncias para que isso acontecesse”, acrescentou, referindo-se à guerra.

O evento de moda, que é baseado num conto de fadas infantil, conta com instalações de vídeo, música ao vivo, cheiros e exibições tradicionais, o que tem animado os ucranianos que por ali passam. Nem mesmo os mísseis que se abateram sob a região durante a madrugada do primeiro dia de desfiles moveram quem só quer "continuar a viver".