São cerca de 11 mil os atletas em Tóquio para os Jogos Olímpicos. Todos com aspiração de superarem o melhor de que são capazes. Todos, pelo menos por alguns momentos, sob os focos do entretenimento global do espetáculo olímpico. Apenas alguns com capacidade para atingirem o pódio.
Simone Biles, aos 24 anos, a mais brilhante ginasta do nosso tempo, chegou a estes Jogos precedida pela fama de estar destinada a ser a deusa de todas as competições da capital do Japão.
Ela representa o ideal de atleta. Junta a perfeição no trabalho físico com a capacidade para ir sempre mais longe nas piruetas e acrobacias da ginástica moderna. O percurso dela, incluído o desempenho nos campeonatos dos EUA, há dois meses em Indianapolis, apontava-a para o recorde de seis medalhas olímpicas nestes Jogos.
A rede americana de televisão NBC pagou milhões pelos direitos de transmissão dos Jogos. Com Simone Biles como cabeça de cartaz.
A pressão sobre Biles tornou-se altíssima. O Comité Olímpico Internacional e várias marcas parceiras entraram em euforia com a expectativa de estar ativada uma máquina de fazer dinheiro. Acreditavam que a ginasta se lançaria às medalhas de ouro, custasse o que custasse. As medalhas como prioridade absoluta.
Todos sabiam que Simone Biles é uma supercampeã que sabe sempre definir novas fronteiras. Sempre valente, sempre grande, incluindo quando teve de ter força interior para se expor ao peso da denúncia de ter sido alvo de tentativas de abusos sexuais por parte do médico que acompanha os ginastas na federação desta modalidade nos EUA.
Como ela sabe definir os limites, quando se esperava que ela chegasse ao Olimpo, ela decidiu parar.
Em vez de se lançar às seis medalhas de ouro escolheu, no momento de máxima expectativa, retirar-se.
Simone Biles deixa uma lição que é também uma herança para os atletas do futuro: mais importante do que o Comité Olímpico Internacional e as marcas parceiras, é a pessoa que está envolvida como atleta.
De facto, por mais engenhosa que seja a organização do COI, o talento que toda a gente quer apreciar é o dos atletas.
Biles preparou-se para estes Jogos mas não estava satisfeita. Retirou-se, para já das primeiras provas a que correspondiam duas medalhas. Não sabemos ainda se vai aparecer em alguma das quatro especialidades em competição nos próximos dias.
Ela mostrou valentia de campeã ao decidir parar antes de rebentar. Teve a coragem de assumir que estava em sobrecarga física.
Ela é uma supercampeã e também um ser humano que sabe que essa condição tem limites. Há quem esteja a acusá-la de fraquejar. Mas o que ela está a mostrar é a força para escolher parar, independentemente das pressões. Mostrou que sabe recusar ficar escrava da engrenagem.
Esperava-se que Simone Biles marcasse estes Jogos em Tóquio. Está de facto a fazê-lo, ainda que sem ser na competição, mas pela atitude.
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