Três perguntas e respostas sobre a morte de João Rendeiro
O antigo presidente do Banco Privado Português, João Rendeiro, foi hoje encontrado enforcado no estabelecimento prisional de Westville, na África do Sul, onde cumpria prisão preventiva depois de ter sido detido em 11 de dezembro na cidade de Durban, pós quase três meses fugido à justiça portuguesa.
Segundo o DN, o corpo foi encontrado na cela onde estava detido "perto da meia-noite desta quinta-feira pelos guardas prisionais.
"O DCS lançou urgentemente uma investigação para determinar a causa e as circunstâncias que levaram à sua morte", diz uma nota dos Serviços Penitenciários enviada à Lusa.
Questionado pela Lusa sobre as circunstâncias em que foi encontrado morto na cela onde estava detido, o porta-voz dos serviços prisionais da África do Sul, Singabakho Nxumalo, escusou-se a dar mais informação, referindo apenas que as autoridades sul-africanas estão a investigar o incidente.
"Assim que tivermos os resultados da autópsia, serão anunciadas as causas da morte, a investigação continuará para determinar as causas da morte. Estamos também a investigar a hora em que se realizou a última ronda [às celas], a hora que foi visto na cela e quando é que foi constatada a morte", explicou.
Segundo porta-voz, o corpo de João Rendeiro foi transportado hoje para uma morgue fora da cadeia, em Durban, onde será submetido a uma autópsia para se averiguar as causas da sua morte.
A ainda advogada de João Rendeiro revelou que foi chamada para identificar o corpo do ex-presidente do BPP e que vai iniciar os procedimentos da trasladação para Portugal.
Recorde-se que em Portugal, o ex-banqueiro foi condenado em três processos distintos relacionados com o colapso do BPP, tendo o tribunal dado como provado que retirou do banco 13,61 milhões de euros. Das três condenações, apenas uma já transitou em julgado e não admite mais recursos, com João Rendeiro a ter de cumprir uma pena de prisão efetiva de cinco anos e oito meses.
João Rendeiro foi ainda condenado a 10 anos de prisão num segundo processo e a mais três anos e seis meses num terceiro processo, sendo que estas duas sentenças ainda não transitaram em julgado.
O colapso do BPP, em 2010, lesou milhares de clientes e causou perdas de centenas de milhões de euros ao Estado.
Na África do Sul estava a enfrentar um processo de extradição ao qual se opunha.
A sessão preparatória do julgamento do processo de extradição para Portugal iria ter lugar dentro de uma semana e as sessões do julgamento iriam decorrer entre 13 e 30 de junho.
A advogada de João Rendeiro na África do Sul disse ao SAPO24 que tem "a certeza de que foi suicídio". June Marks diz que está "em choque" com a morte do ex-banqueiro, esta sexta-feira, e revela que nunca imaginou que ele [João Rendeiro] fosse fazer isto.
Foi Marks que confirmou a notícia da morte do antigo banqueiro.
Durante a manhã a advogada revelou ainda que ia deixar de representar João Rendeiro. A informação foi confirmada pela própria ao SAPO24, sem, no entanto, adiantar os motivos dessa decisão: "Em respeito por tudo, as razões ficarão entre mim e o João".
Questionada pela Lusa, June Marks confirmou também que iria deixar de representar o antigo presidente do BPP, mas escusou-se a adiantar as razões. Citada pela agência Lusa, a advogada diz ainda ter sido ela a solicitar a comparência no tribunal: “Ele morreu antes de eu poder retirar [o patrocínio]”. June Marks contou que a última vez que esteve com Rendeiro na prisão foi em abril.
O Ministério Público sul-africano (National Prosecuting Authority, NPA) revelou que João Rendeiro iria hoje comparecer em tribunal, precisamente porque a sua advogada, June Marks, ia deixar de o representar no julgamento do processo de extradição.
“A conferência de pré-julgamento para a audiência de extradição de João Rendeiro foi marcada para 20 de maio de 2022. Durante esta semana, o Estado recebeu uma notificação do representante legal do Rendeiro, declarando que ela irá retirar os seus serviços. O Estado requisitou então que Rendeiro comparecesse hoje no Tribunal de Verulam para que as questões jurídicas pudessem ser abordadas antes da conferência de pré-julgamento da próxima semana”, refere uma nota do NPA à comunicação social.
No entanto, ao início da tarde, June Marks revelou que tomou “há um mês” a decisão de deixar a defesa de João Rendeiro devido a razões financeiras.
“Ele não tinha fundos e o Estado deveria nomear um advogado oficioso para assistência jurídica”, referiu, confirmando ter informado as autoridades sul-africanas desta situação: “Ele insistiu para eu continuar, mas não tinha fundos para pagar”.
Questionada se João Rendeiro tinha justificado a sua falta de meios financeiros com o arresto dos bens devido aos processos judiciais que enfrentava em Portugal, June Marks confirmou que esse foi, efetivamente, o argumento usado pelo antigo presidente do BPP.
O que acontece aos processos que envolviam João Rendeiro em Portugal?
Segundo explicou à agência Lusa o advogado Miguel Matias, em relação a todos os processos transitados ou não em julgado, “os efeitos criminais extinguem-se com a morte”.
“Todos os processos que já tinham sido julgados e em que ainda não havia (…) decisão extinguem-se. Nos que já havia condenação transitada em julgado, como foi o que originou o pedido de extradição, também se extingue a pena, por força da morte, mas isto apenas relativamente a João Rendeiro”, afirmou.
O advogado, especialista em Direito Penal, explicou que isto apenas acontece relativamente às responsabilidades criminais de João Rendeiro, e não aos restantes arguidos nos processos.
“Todas as circunstâncias relativas à responsabilidade criminal extinguem-se relativamente a João Rendeiro, mas como há processos onde há mais arguidos, continuam os processos relativamente aos restantes”, explicou.
Já do ponto de vista civil, Miguel Matias explicou ainda: “Convém saber o que é a herança de João Rendeiro e se, porventura, os seus herdeiros vierem a receber montantes relacionados com esta herança, se existirem responsabilidades de João Rendeiro, serão responsáveis até ao limite daquilo que tiverem recebido”.
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