No jogo das cadeiras do Médio Oriente, Assad perdeu o lugar. O que aconteceu na Síria?
A guerra civil na Síria está de novo no centro das atenções, depois de uma nova coligação rebelde ter lançado um ataque surpresa, invadindo a segunda maior cidade do país, Alepo.
A ofensiva, segundo reportam a CNN e o Independent, é a primeira em que as forças da oposição conquistam território em Alepo desde 2016, quebrando o impasse de uma guerra que, formalmente, nunca terminou.
O recrudescimento do conflito, que já matou mais de 300.000 pessoas e fez sair do país quase seis milhões de refugiados, tem também amplas ramificações na região.
Já hoje, os rebeldes declararam Damasco ‘livre’ do Presidente Bashar al-Assad, após 12 dias de ofensiva de uma coligação liderada pelo grupo islâmico Organização de Libertação do Levante (Hayat Tahrir al Sham ou HTS, em árabe), juntamente com outras fações apoiadas pela Turquia, para derrotar o governo sírio.
O Presidente sírio, no poder há 24 anos, deixou o país perante a ofensiva rebelde, segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH).
Rússia, China e Irão manifestaram preocupação pelo fim do regime, enquanto a maioria dos países ocidentais e árabes se mostrou satisfeita por Damasco deixar de estar nas mãos do clã Assad.
No poder há mais de meio século na Síria, o partido Baath foi, para muitos sírios, um símbolo de repressão, iniciada em 1970 com a chegada ao poder, através de um golpe de Estado, de Hafez al-Assad, pai de Bashar, que liderou o país até morrer, em 2000.
O que aconteceu na guerra civil da Síria?
No auge da primavera Árabe, em 2011, manifestantes pró-democracia saíram à rua na Síria, apelando à destituição do presidente autoritário Bashar al-Assad.
Os manifestantes foram recebidos com uma repressão mortífera. À medida que as forças de al-Assad esmagavam o movimento pró-democracia, começou a formar-se uma oposição armada composta por pequenas milícias orgânicas e alguns desertores do exército sírio.
As forças da oposição – descentralizadas, compostas por diferentes ideologias, mas com o objetivo comum de derrubar al-Assad – foram apoiadas de várias formas por potências estrangeiras, incluindo a vizinha Turquia, os gigantes regionais Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, bem como pelos Estados Unidos.
À medida que as forças antigovernamentais cresciam, os aliados da Síria, como o Irão e a Rússia, intensificaram o apoio. No terreno, a Guarda Revolucionária do Irão e o seu representante libanês, o Hezbollah, ajudaram a combater os grupos rebeldes armados. A Força Aérea Síria foi reforçada por aviões de guerra russos.
Os extremistas islâmicos, incluindo a Al-Qaida, interessaram-se pela Síria, assumindo uma causa comum com a oposição síria moderada, que não via com bons olhos o envolvimento dos jihadistas.
Mas, em 2014, os extremistas dominaram e o grupo Estado Islâmico (EI) começou a espalhar-se pelo país e uma coligação internacional liderada pelos Estados Unidos entrou em ação com o objetivo de eliminar o grupo sem confrontar o regime sírio.
As Forças Democráticas da Síria (FDS) – um parceiro dos Estados Unidos constituído por combatentes curdos – acabaram com o domínio territorial do EI.
Em 2020, a Rússia e a Turquia acordaram um cessar-fogo na última província controlada pela oposição, Idlib, concordando em estabelecer um corredor de segurança com patrulhas conjuntas.
Desde então, não se registaram grandes confrontos, mas o governo sírio nunca recuperou todo o seu território.
Porque se reacendeu o conflito agora?
A ofensiva começou depois de os rebeldes terem formado uma nova coligação chamada “Comando de Operações Militares”.
Rapidamente, os rebeldes invadiram aldeias nos arredores de Alepo e os residentes divulgaram que estes iam controlando grande parte da cidade, encontrando pouca resistência pelo caminho.
Os combatentes afirmaram que estavam a tentar libertar um território ocupado e a responder à intensificação dos ataques das forças governamentais e dos grupos de milícias pró-iranianos.
Em resposta ao avanço dos rebeldes, as forças aéreas russas, principal parceiro de al-Assad nos céus, e sírias lançaram uma ofensiva nas províncias de Alepo e Idlib.
Entretanto, o Irão foi alvo de uma série de ataques por parte de Israel, nomeadamente contra o Hezbollah. Analistas defendem que os rebeldes sírios estão a ocupar o vazio deixado pelo grupo para avançar na Síria.
O que se passou em Damasco?
Dezenas de pessoas saíram às ruas de Damasco, segundo a AFP, para celebrar a queda do regime que era controlado há mais de meio século pela mesma família. Várias pessoas atacaram a estátua de Hafez al-Assad, pai de Bashar al-Assad.
Na praça dos Omeias, o barulho dos tiros e sinais de alegria misturava-se com os gritos de "Allahu Akbar" ("Deus é grande").
"Esperávamos por este dia há muito tempo", disse Amer Batha por telefone à AFP. "Não posso acreditar que estou a viver este momento", acrescentou, sem conter as lágrimas de alegria. Na televisão pública, os rebeldes anunciaram a queda do "tirano" Bashar al-Assad e a "libertação" de Damasco.
Também afirmaram que libertaram todos os prisioneiros "detidos injustamente" e pediram a proteção das propriedades do Estado sírio "livre".
Os rebeldes também anunciaram "a fuga" do presidente numa mensagem no Telegram: "Assad saiu da Síria pelo Aeroporto Internacional de Damasco antes que os membros das Forças Armadas e de segurança abandonassem o local", disse à AFP Rami Abdel Rahman, diretor do Observatório Sírio para Direitos Humanos, uma ONG com sede no Reino Unido que tem uma ampla rede de fontes dentro da Síria.
O líder do grupo islamista radical Hayat Tahrir al Sham (HTS), Abu Mohammad al-Jolani, pediu aos seus combatentes que não se aproximem das instituições públicas e afirmou que devem permanecer sob a autoridade do primeiro-ministro até à "transferência oficial" do poder. As tropas do governo também perderam o controlo da cidade de Daraa, berço da revolta de 2011 e localizada a sul da capital, perto da fronteira com a Jordânia.
Também pelo mundo inteiro centenas de pessoas foram este domingo para às ruas de Istambul, Londres, Atenas e Berlim onde vive uma diáspora sírios, celebrar a "fuga" do presidente.
Quem são os rebeldes?
O novo grupo, que os Estados Unidos e a ONU há muito consideram como uma organização terrorista, é constituído por um vasto espetro de forças da oposição, desde fações islamistas a moderados.
A liderá-los está o grupo Hayat Tahrir al-Sham (HTS), um antigo afiliado da Al-Qaida na Síria, que costumava ser conhecido pelo nome Frente Al-Nusra.
O seu líder, Abu Mohammed al-Jolani, surgiu como líder do ramo sírio da Al-Qaida em 2011, nos primeiros meses da guerra na Síria. A sua luta foi uma intervenção indesejável para muitos membros da oposição síria, que esperavam que a luta contra o regime brutal de al-Assad não fosse contaminada pelo extremismo violento.
Desde cedo, al-Jolani reivindicou a responsabilidade por bombardeamentos mortíferos, prometeu atacar as forças ocidentais e enviou a polícia religiosa para impor o uso de roupas modestas pelas mulheres.
Nos últimos anos, procurou reformular-se, renunciando aos seus laços com a Al-Qaida em 2016, dissolvendo a sua polícia religiosa, reprimindo os grupos extremistas no seu território e apresentando-se como um protetor de outras religiões, nomeadamente autorizando a primeira missa cristã na cidade de Idlib em anos.
O grupo tem sido quem governa, de facto, Idlib. A eles juntaram-se grupos apoiados pela Turquia e outros anteriormente apoiados pelos Estados Unidos.
A complicar a situação está o facto de alguns dos grupos rebeldes estarem também a combater as Forças Democráticas Sírias (FDS).
O Exército Sírio Livre, apoiado pela Turquia, que faz parte da coligação rebelde que tomou o controlo da maior parte da cidade de Alepo, afirmou no domingo ter tomado o controlo das cidades de Tal Rifaat, Ain Daqna e Sheikh Issa, na parte norte da província de Alepo.
Estes territórios eram anteriormente detidos pelas Forças Democráticas Sírias.
As FDS são maioritariamente compostas por combatentes curdos de um grupo conhecido como Unidades de Proteção Popular (YPG), que é considerado uma organização terrorista pela vizinha Turquia.
Qual a reação internacional?
Vários líderes internacionais já reagiram a esta reviravolta na Síria. Donald Trump disse:“Al-Assad foi-se embora. Ele fugiu do seu país. O seu protetor, a Rússia, liderada por [o Presidente] Vladimir Putin, já não o queria proteger”.
Segundo Trump, a Rússia “perdeu todo o interesse na Síria por causa da Ucrânia, onde cerca de 600.000 soldados russos estão feridos ou mortos, numa guerra que nunca deveria ter começado e que pode durar para sempre”.
“A Rússia e o Irão estão atualmente enfraquecidos, um por causa da Ucrânia e de uma má economia, o outro por causa de Israel e dos seus sucessos em combate”, acrescentou Trump.
Sublinhou que este é um momento de "oportunidade histórica para o povo em sofrimento da Síria construir um futuro melhor", mas que também é "um momento de risco e incerteza".
Prometeu também apoiar os vizinhos da Síria, incluindo "a Jordânia, Líbano, Iraque e Israel", durante a transição de poder na Síria. "Falarei com os líderes da região nos próximos dias".
Mais tarde soube-se que aviões dos Estados Unidos atacaram mais de 75 alvos do Estado Islâmico (EI) na Síria este domingo, atingindo líderes do grupo, operações e campos, informou o exército americano.
Por parte de Israel soube-se ao longo da tarde que supostos ataques aéreos israelitas atingiram o distrito de Mazzeh, em Damasco. Sabe-se ainda que as forças armadas de Israel criaram uma “zona-tampão” na fronteira com a Síria e pediram aos habitantes que fiquem em casa.
O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, saudou hoje a queda do Presidente sírio e afirmou que este acontecimento marca “um dia histórico”, representando o fim de “um nódulo central do eixo do mal”.
“Este é um dia histórico na história do Médio Oriente” e “uma consequência direta dos golpes que desferimos no Irão e no Hezbollah, os principais apoiantes do regime de al-Assad”, disse Netanyahu.
Onde está Bashar al-Assad?
Citando uma fonte no Kremlin, a agência estatal russa TASS informou que Assad e os seus familiares receberam asilo na capital russa, Moscovo.
Houve muita especulação sobre o paradeiro de Assad após relatos de que fugiu de Damasco antes que os rebeldes chegassem esta manhã.
A Rússia, um dos aliados mais próximos de Assad, confirmou hoje mais cedo que este havia deixado a Síria, mas não disse onde estava, nem se Moscovo lhe deu refúgio.
Quantas pessoas já morreram?
Pelo menos 910 pessoas, incluindo 138 civis, morreram na Síria desde que os rebeldes iniciaram uma ofensiva relâmpago a 27 de novembro, que resultou na tomada de Damasco e na fuga do presidente Bashar al-Assad, informou a ONG Observatório Sírio para os Direitos Humanos.
A ONG registou as mortes de 380 integrantes das tropas sírias e aliados do governo deposto e de 392 combatentes rebeldes.
*Com Lusa e AFP
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