Bardella, 28 anos, está à cabeça da extrema-direita Rassemblement National (RN), construção política de Marine Le Pen. Bardella tem ideologia de extrema-direita, mas à primeira impressão não parece de extrema-direita. Fala com calma, mostra-se afável, nunca grita, não insulta, é disputado para as selfies e é visto como “genro ideal” em largas faixas atraídas pelas direitas.
“La France revient”, França de volta, slogan de Bardella, replica o “America is Back” de Ronald Reagan, fonte de inspiração assumida por Bardella, que quer cortar radicalmente a imigração, tirar direitos aos estrangeiros e usar como eficaz arma política eleitoral a devolução do poder de compra aos franceses, quer pela contenção de preços quer pela drástica redução de impostos - cenário que, considerado o mau estado das contas públicas francesas, inquieta quem é mestre na economia.
Marine Le Pen, mentora de Bardella, escolheu-o para levar o partido Rassemblement National à maioria parlamentar e à chefia do governo de França, deixando-a totalmente dedicada à grande ambição que é a sucessão de Emmanuel Macron com a conquista da Presidência da República de França. Tudo previsto para 2027. Mas as eleições europeias que no passado 9 de junho deram um de cada três votos ao RN de LePen/Bardella e menos de metade (14,5%) ao partido de Macron, levou o presidente a, perante surpresa geral, logo na noite das eleições, chamar os franceses às urnas para escolha de deputados, com primeira volta em 30 de junho e a segunda em 7 de julho, a menos de três semanas da abertura, em 26 de julho, dos Jogos Olímpicos com epicentro em Paris.
Muita gente interroga-se sobre o que pretende Macron ao antecipar estas eleições. Ninguém pensa que ele acredite que ainda pode conseguir a reviravolta e recuperar a maioria como está a pedir.
Em 2017, o partido de Macron, logo após a eleição presidencial, alcançou farta maioria absoluta com 351 dos 577 lugares no parlamento francês. Em 2022, o partido presidencial voltou a ganhar mas já estava em declive, elegeu apenas 249 deputados e passou a enfrentar complexas negociações com as oposições à esquerda e à direita. Agora, nas várias projeções, o partido presidencial cai para terceiro lugar na maioria dos 577 lugares em eleição local e assim, com o sistema eleitoral francês, corre o risco de ficar com representação parlamentar reduzida a escassas dezenas de deputados. O macronismo está confrontado com forte rejeição pelos franceses.
Em contrapartida, a extrema-direita que Marine Le Pen soube desdiabolizar, que rebatizou como Rassemblement National (União ou Reagrupamento Nacional), em operação cosmética para retirar a carga hostil da Frente Nacional do pai, Jean Marie Le Pen (partido que agregou colaboracionistas com a Alemanha nazi), passou de apenas 8 deputados em 2017 para 89 em 2022.
Nessa última eleição legislativa, há dois anos, a soma dos partidos à esquerda deu 153 deputados, enquanto a direita tradicional, o partido Republicano (LR), que foi o de Pompidou e Chirac, elegeu 74. Macron, ao centro ou centro-direita, elegeu, recordemos, 249.
Agora, as sondagens anunciam que o RN de Bardella dispara de 89 para 220 a 270 deputados. Pode chegar à maioria absoluta se eleitores republicanos (LR) seguirem o líder, Eric Ciotti, que em manobra de sobrevivência política, quis juntar-se aos ultras RN. Mas os republicanos estão divididos, está mesmo em curso um folhetim político com outros dirigentes e vários militantes a quererem expulsar Ciotti por “trair os princípios e a história do partido”.
Surgiu uma novidade que ainda pode mudar o epílogo desta inesperada e escaldante campanha francesa: perante a iminência de governo ultra à direita, o centro-esquerda e as esquerdas francesas decidiram meter na gaveta as fundas divergências que têm (sobre a União Europeia, sobre a Rússia e a Ucrânia, sobre o Hamas, muitas mais) e todos os partidos, socialista, comunista, verdes e insubmissos, juntam-se numa Frente Popular como a de antes da II Grande Guerra, com o objetivo de barrar o caminho para o governo às direitas encabeçadas pelo RN de Le Pen e Bardella. Esta Frente Popular começou por aparecer na quinta-feira como uma frente da esquerda puxada para a esquerda, mas entretanto a candidatura a deputado de figuras como o ex-presidente François Hollande, notoriamente social-democrata muito ao centro, faz admitir a possibilidade de algum êxito para esta Frente Popular. Não se vê que possa tirar a vitória à RN mas com à volta de 200 deputados pode contribuir para um “cordão sanitário” amplo que impeça o governo do RN.
A campanha eleitoral começa nesta segunda-feira, 17 de junho, não teve preparação, é curtíssima.
Vários peritos em sondagens e analistas políticos previnem que tudo está em aberto. É provável, é quase certo, que muitos dos que nas europeias, agora, perante o dramatismo da escolha, vão votar. Mesmo muitos dos que em 2017 votaram em Macron e entretanto se zangaram com ele, poderão, na emergência, regressar ao voto no partido presidencial.
Há muita mobilização entre os jovens, sobretudo nas duas extremas, à esquerda e à direita.
O partido de Marine Le Pen, conduzido por Jordan Bardella, nunca esteve tão perto de chegar à chefia do governo de França. Mas, nestas duas semanas de campanha, o alarme pelo salto ara o desconhecido pode levar a que se forme uma maioria ampla para impedir que a França antecipe o modelo Trump já neste 2024.
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